terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Manifesto Rádio Muda

Rádio Muda 3 X 1 PF+Anatel


Os Piratas nos atacaram. Sequestraram nosso timoneiro DJ Computer. Hoje, dia 19/02/2009, às 5 da manhã, doze Piratas Federais (PF) saquearam todos os equipamentos do estúdio da Rádio Muda, rádio livre que funciona há mais de 20 anos em Barão Geraldo, Campinas-SP.

Em uma ação decorrente da "Operação Silêncio", que fechou diversas rádios em todo o país, um bando de 14 homens, 12 agentes federais, 2 chaveiros (um para segurar a chave e outro para rodar?), liderados por um delegado, tomaram de assalto o estúdio a mando da juíza substituta Fernanda Soraia Pacheco Costa. Vandalizaram o estúdio, rasgaram cartazes e confiscaram todos os equipamentos. Nao havia nenhum mudeiro no momento da ação sórdida.

A Rádio Muda é uma rádio que não é ilegal, nem legal, é uma rádio livre, pois, assim como inúmeras outras, não possui fins comerciais, não pratica proselitismo religioso nem político partidário, e atua de maneira integrada a sua vizinhança, estabelecendo uma relação de reciprocidade através da qual quem ouve, pode falar, ou seja, todo ouvinte é um emissor em potencial. Espalhadas pelo Brasil e pelo mundo, essas rádios baseiam-se na legitimidade que suas comunidades e vizinhanças lhe conferem. Atua com baixa potência e atinge apenas uma pequena região da cidade de Campinas. Ao invés da legalidade exigida por leis estatais que legitimam um sistema corrupto e viciado de concessão de radiodifusão, a legitimidade deste tipo de prática deve ser protegida como liberdade de expressão e organização local.

Qual é o papel da radiodifusão hoje?

As rádios comerciais, consideradas legais, integram o território nacional a partir de interesses comerciais e culturais homogeneizantes. As rádios livres, consideradas ilegais, permitem que a pluralidade cultural seja livremente expressa. Tudo aquilo que não encontra espaço na lucrativa e monopolizada mídia comercial tem a possibilidade de vazão nos meios geridos pela própria população.

Mundialmente a mídia é controlada por 10 conglomerados. 40 empresas estão ligadas direta ou indiretamente a eles. No Brasil, 90% da mídia é controlada por 13 famílias. Em Campinas, a RAC (Rede Anhanguera de Comunicação) controla os principais meios de comunicação da cidade e região.

Centenas de rádios não comerciais espalhadas pelo Brasil e pelo mundo atuam no sentido contrário a essa situação de monopólio, reafirmando a capacidade de toda e qualquer pessoa de produzir informação.

Rádio Livre derruba avião?

Um dos principais argumentos contra às rádios livres e de baixa potência é que constituem séria ameaça para tráfego aéreo e a comunicação de emergência. Porém, nunca um acidente aéreo foi causado por este tipo de radiodifusão. Aliás, se fosse fácil assim, com umas mil rádios
comunitárias, Sadam teria vencido a invasão de Bush no Iraque.... será que ele não pensou nisso, ou será que esta informação "técnica" não faz o menor sentido?

Pra quem não sabe, aviões operam em uma frequência de rádio acima da faixa de frequência das rádio FM. Para que uma rádio FM interfira nas transmissões aéreas de rádio, é necessário primeiro que o transmissor esteja desregulado e sem filtros. Hoje em dia, é muito comum o uso de
transmissores que possuem filtros de harmônicos e filtros passa-faixa, que mesmo não sendo homologado pela Anatel, está dentro da máscara de transmissão da norma brasileira de radiodifusão, ou seja, que passou por um teste técnico no qual um analisador de espectro comprova que fora da frequência de transmissão o sinal é fortemente atenuado, o que comprova sua a precisão e a capacidade de não interferência de um transmissor. O segundo fator é a potência do transmissor.

A prática mostra que as rádios livre funcionam com transmissores de baixa potência (potências altas significam custos altos). Comparados aos transmissores das rádios comerciais, com potências gigantes, não representam perigo de interferência nas comunicações aéreas, mesmo com um transmissor não perfeitamente construído. Quem tem que cuidar da aferição dos seus transmissores potentes são as grandes rádios comerciais, que apresentam altos riscos de interferência na comunicação aérea!

Piratas?

Piratas são as rádios comerciais que querem o ouro!

Não estamos atrás do lucro.

Livre?

O sistema de leis estatais prevê que a organização e concessão do direito de uso para as frequências de rádio seja realizado por um grupo de pessoas restrito- técnicos, especialistas, políticos e grupos econômicos.

A comunicação livre não reconhece o governo como única entidade capaz de elaborar leis e regras relativas ao funcionamento dos meios de comunicação. Propomos, através da prática, a apropriação e utilização de qualquer meio de comunicação e tecnologia.

Todas as tecnologias são e deveriam ser consideradas bens universais destinadas ao desenvolvimento humano, sua inteligência, afeto e comunicação.

O conhecimento não pode ser aprisionado por leis medíocres que se baseiam em interesses mesquinhos de grupos políticos e econômicos ou mesmo de leis que não comportam a capacidade da população de produzir suas próprias informações, a partir de meios de comunicação geridos coletivamente.

Comunicação se realiza diariamente, nos momentos mais cotidianos. Ampliar essa comunicação de uma pessoa ou grupo através de meios tecnológicos é uma possibilidade e prática que amplia a democracia e a capacidade das pessoas de se comunicarem entre si: falando, ouvindo, produzindo e questionando.

A comunicação está em todos nós, muito antes de existirem governos e leis que a regulamentassem: livre, intrínseca, potente e transformadora.

Conclamamos todos e todas a produzirem mais e mais meios de comunicação.

Não precisamos nos submeter ao monopólio!

Nesse carnaval, sintonize-se, atue: ações pela mídia livre espalhadas pelo território.Organize próprias ações!


A Muda não se cala!!! Voltaremos a transmitir em breve!!

Publicações sobre a Invasão da Polícia:

http://midiaindepen dente.org/
http://www.brasil. agenciapulsar. org/nota. php?id=4205
http://municipe. mandioca. org/archives/ 246
http://mandioca. wordpress. com/
http://www.agenciap ulsar.org/ nota.php? id=14500
http://www.npla. de/poonal/ aktuell.shtml# BRASILIEN

De rabo preso com quem?

Colaboradores: Alípio Freire
22/02/2009 18:34

O que pretende a Folha de São Paulo, sua direção, é ameaçar todos os que se oponham à sua visão de mundo e aos seus objetivos.

O que pretende a Folha de São Paulo, sua direção, é ameaçar todos os que se oponham à sua visão de mundo e aos seus objetivos
Alípio Freire

A criação pelo jornal Folha de S. Paulo (FSP), da expressão “ditabranda” em seu editorial de 17 de fevereiro, para nomear a ditadura imposta com o golpe de 1964 e, em seguida, a agressão aos professores Maria Victoria de Mesquita Benevides e Fábio Konder Comparato, expressa em nota na seção de cartas da edição de 20 de fevereiro, não podem ser atribuídas apenas aos “maus bofes” de um jovem (?) herdeiro rico, mimado, que se supõe gênio (o que diariamente lhe repete sua corte), que não conhece limites e, portanto, afeito a chiliques.

Embora seja também isso, é muito mais, e só pode ser entendido a partir da história daquele jornal, e no quadro mais amplo do avanço (em nível internacional) das idéias, valores e políticas nazi-fascistas.

Sobre a trajetória do pasquim da Barão de Limeira, vejamos alguns depoimentos:

“Abandono do emprego”

A jornalista Rose Nogueira, presa pelos órgãos de repressão da ditadura no dia 4 de novembro de 1969, quando estava de licença maternidade da FSP, onde trabalhava, conta:

“Vinte e sete anos depois [19997], descubro que fui punida não apenas pela polícia toda-poderosa (...), pela justiça militar (...). Ao buscar, agora, nos arquivos da Folha de S. Paulo a minha ficha funcional, descubro que, em 9 de dezembro de 1969, quando estava presa no Deops, incomunicável, ‘abandonei’ meu emprego de repórter do jornal. Escrito a mão, no alto: ABANDONO. E uma observação oficial: Dispensada de acordo com o artigo 482 – letra ‘i’ da CLT abandono de emprego’. Por que essa data, 9 de dezembro? Ela coincide exatamente com esse período mais negro, já que eles me ‘esqueceram´por um mês na cela’. (...) Todos sabiam que eu estava lá (...) Isso era – e continua sendo – ilegal em relação às leis trabalhistas e a qualquer outra lei, mesmo na ditadura dos decretos secretos. Além do mais, nesse período, se estivesse trabalhando, eu estaria em licença maternidade”. (Rose Nogueira, “Em corte seco”, in “Tiradentes um presídio da ditadura”, Coord. Alípio Freire, Izaías Almada e J.A. de Granville-Ponce – Scipione Cultural - 1997).

Palafreneiros da ditadura

O jornalista Mino Carta, em entrevista à AOL, em 2004, quando se completavam 40 anos do golpe, comenta as relações da FSP com a ditadura:

“A Folha de São Paulo não só nunca foi censurada, como emprestava a sua C-14 [carro tipo perua, usado para transportar o jornal] para recolher torturados ou pessoas que iriam ser torturadas na Oban [Operação Bandeirante]. Isso está mais do que provado. É uma das obras-primas da Folha, porque o senhor Caldeira [Carlos Caldeira Filho], que era sócio do senhor Frias [Octavio Frias de Oliveira], tinha relações muito íntimas com os militares. E hoje você vê esses anúncios da Folha - o jornal desse menino idiota chamado Otavinho [Otavio Frias Filho] - esses anúncios contam de um jeito que parece que a Folha, nos anos de chumbo, sofreu muito, mas não sofreu nada. Quando houve uma mínima pressão, o sr. Frias afastou o Cláudio Abramo da direção do jornal. Digo que foi a "mínima pressão" porque o sr. Frias estava envolvido na pior das candidaturas possíveis, na sucessão do general Geisel. A Folha estava envolvida com o pior, apoiava o Frota [general Sílvio Frota, ministro do Exército no governo Geisel]. O Claudio Abramo foi afastado por isso.“

("A mídia implorava pela intervenção militar" Entrevista com Mino Carta. Por Adriana Souza Silva, da Redação AOL, abril de 2004)


O testemunho da pesquisadora

A historiadora e pesquisadora carioca, doutora Beatriz Kushnir, autora do mais completo trabalho sobre o comportamento da grande mídia comercial durante a ditadura, “Cães de Guarda”, é lembrada pelo jornalista Paulo Henrique Amorim, em sua “Conversa Afiada” de 20 de fevereiro, a propósito da FSP:

“Como demonstrou Beatriz Kushnir (...) a Folha cedia as vans para o Doi-Codi fazer diligências, levar suspeitos para as sessões de tortura e fingir que se tratava de um carro de reportagem em atividade jornalística”. (“Cães de Guarda” – jornalistas e censores do AI-5 à Constituição de 1989”, de Beatriz Kushnir, Boitempo Editorial).

Em sua coluna, Amorim reitera ainda a denúncia feita por Mino Carta a respeito do afastamento do jornalista Cláudio Abramo do comando do jornal.

Quanto ao episódio da utilização dos carros da FSP para fins repressivos – como apontam Mino Carta e Paulo Henrique – é fato que consta de diversas publicações e depoimentos. A revista “Teoria & Debate” – da Fundação Perseu Abramo – nos anos 1990, publicou uma carta do ex-preso político e hoje advogado de movimentos populares e causas ligadas aos direitos humanos, Aton Fon Filho, que denuncia exaustivamente essa ligação criminosa.

Um diário oficial da repressão

Mas, não pensem os leitores que a história da empresa Folha da Manhã (propriedade da família Frias), da qual a “Folha de S. Paulo” nos anos da ditadura era apenas um título (ainda que o carro chefe), num conjunto que somava mais de meia dúzia de outros, como os jornais “Última Hora”, “Noticias Populares”, “Folha de Santos”, etc., sem esquecermos, é claro, a menina-dos-olhos da repressão, a “Folha da Tarde”.

A “Folha da Tarde” (FT) é um capítulo à parte. Algo assim, como se a FSP coubesse em “obras escolhidas” e ela, a FT, merecesse “obras completas”. Até 1968 esse jornal cobria de forma razoavelmente decente o movimento estudantil, e outras manifestações de oposição à ditadura. Contava com uma equipe formada, em sua maioria esmagadora, de bons e sérios profissionais – muitos dos quais acabariam posteriormente presos, como o caso da jornalista Rose Nogueira. Na ocasião, o logotipo do jornal era vermelho. Passados alguns meses da decretação do Ato Institucional Número 5, de repente, não apenas o logotipo foi mudado para preto, como sua direção passou a ser composta de pessoas ligadas aos órgãos de repressão, inclusive à famosa Escuderie Le Coc (nome fantasia do Esquadrão da Morte) – o que facilmente qualquer neófito é capaz de perceber, folheando a coleção desse jornal. Também a essa questão se refere, com detalhes, a historiadora Beatriz Kushnir em seu livro “Cães de Guarda”.

Uma ameaça a todos os brasileiros

Dadas essas breves pinceladas sobre a trajetória da Ilustre Folha, cabe chamar a atenção para um importante aspecto que é o verdadeiro significado da nota e da agressão contra os professores Maria Victoria e Comparato: ao atacar tão virulenta e desrespeitosamente essas duas figuras que merecem toda a admiração do nosso povo e de todos os homens e mulheres que lutam por uma sociedade democrática e justa, onde os direitos humanos e todos os direitos dos cidadãos sejam respeitados, o que pretende a Folha de S. Paulo, sua direção, é ameaçar todos os que se oponham à sua visão de mundo e aos seus objetivos.

Aliás, entendemos que caberia ao governador José Serra, seu partido e seus aliados do DEM – de quem a FSP é deslavado cabo eleitoral, transgredindo todas as normas éticas e legislação eleitoral – manifestarem-se publicamente a respeito desse episódio que, sem dúvida alguma, os compromete.



Alípio Freire é jornalista e escritor, foi presidente da Associação Brasileira de Imprensa – Seção São Paulo (1978-1979), e editor de Política Internacional da Folha de S.Paulo (1977-1979). Preso político (1969-1974), pertence hoje aos conselhos editoriais do jornal Brasil de Fato, da Editora Expressão Popular e da Revista Fórum, além de integrar o Conselho Político da revista Teoria & Debate. Colabora ainda com diversas publicações populares e de esquerda.

"Solução neokeynesiana e novo Bretton Woods são fantasias"

Em entrevista à revista inglesa Socialist Review, István Mészàros, um dos principais pensadores marxistas da atualidade, analisa a crise econômica mundial e critica aqueles que apostam que ela será resolvida trazendo de volta as idéias keynesianas e a regulação. "É uma fantasia que uma solução neo-keynesiana e um novo Bretton Woods resolveriam qualquer dos problemas dos dias atuais", defende Mészàros. Para ele, estamos vivendo a maior crise na história humana, em todos os sentidos.

Judith Orr e Patrick Ward - Socialist Review

Em 1971 István Mészàros ganhou o Prêmio Deutscher pelo seu livro A Teoria da Alienação em Marx e desde então tem escrito sobre o marxismo. Em janeiro deste ano, ele conversou com Judith Orr e Patrick Ward, da Socialist Review, sobre a atual crise econômica.

Socialist Review: A classe dominante sempre é surpreendida por crises econômicas e fala delas como fossem aberrações. Por que você acha que as crises são inerentes ao capitalismo?

István Mészàros – Eu li recentemente Edmund Phelps, que ganhou o Prêmio Nobel de Economia, em 2006. Phelps é um tipo de neokeynesiano. Ele estava, é claro, glorificando o capitalismo e apresentando os problemas atuais como apenas um contratempo, dizendo que “tudo o que devemos fazer é trazer de volta as idéias keynesianas e a regulação.”

John Maynard Keynes acreditava que o capitalismo era ideal, mas queria regulação. Phelps estava reproduzindo a idéia grotesca de que o sistema é como um compositor musical. Ele pode ter alguns dias de folga nos quais não pode produzir tão bem, mas se você olhar no todo verá que ele é maravilhoso! Pense apenas em Mozart – ele deve ter tido o velho e esquisito dia ruim. Assim é o capitalismo em crise, como dias ruins de Mozart. Quem acredita nisso deveria ter sua cabeça examinada. Mas, no lugar de ter sua cabeça examinada, ele ganhou um prêmio.

Se nossos adversários têm esse nível de pensamento – o qual tem sido demonstrado, agora, ao longo de um período de 50 anos, não é apenas um escorregão acidental de economista vencedor de prêmio – poderíamos dizer, “alegre-se, esse é o nível baixo do nosso adversário”. Mas com esse tipo de concepção você termina no desastre de que temos experiência todos os dias. Nós afundamos numa dívida astronômica. As dívidas reais neste país (Inglaterra) devem ser contadas em trilhões.

Mas o ponto importante é que eles vêm praticando orgias financeiras como resultado de uma crise estrutural do sistema produtivo. Não é um acidente que a moeda tenha inundado de modo tão adventista o setor financeiro. A acumulação de capital não poderia funcionar adequadamente no âmbito da economia produtiva.

Agora estamos falando da crise estrutural do sistema. Ela se extende por toda parte e viola nossa relação com a natureza, minando as condições fundamentais da sobrevivência humana. Por exemplo, de tempos em tempos anunciam algumas metas para diminuir a poluição. Temos até um ministro da energia e da mudança climática, que na verdade é um ministro do lero lero, porque nada faz além de anunciar uma meta. Só que essa meta nunca é sequer aproximada, quanto mais atingida. Isso é uma parte integral da crise estrutural do sistema e só soluções estruturais podem nos tirar desta situação terrível.

SR - Você descreveu os EUA como levando a cabo um imperialismo de cartão de crédito. O que você quer dizer com isso?

IM – Eu lembro do senador norte-americano George McGovern na guerra do Vietnã. Ele disse que os EUA tinham fugido da guerra do Vietnã num cartão de crédito. O recente endividamento dos EUA está azedando agora. Esse tipo de economia só avança enquanto o resto do mundo pode sustentar sua dívida.

Os EUA estão numa posição única porque tem sido o país dominante desde o acordo de Bretton Woods. É uma fantasia que uma solução neokeynesiana e um novo Bretton Woods resolveriam qualquer dos problemas dos dias atuais. A dominação dos EUA que Bretton Woods formalizou imediatamente depois da Segunda Guerra era realista economicamente. A economia norte-americana estava numa posição muito mais poderosa do que qualquer outra economia do mundo. Ela estabeleceu todas as instituições econômicas internacionais vitais com base no privilégio dos EUA. O privilégio do dólar, o privilégio aproveitado pelo Fundo Monetário Internacional, pelas organizações comerciais, pelo Banco Mundial, todos completamente sob a dominação dos EUA, e ainda permanece assim hoje.

Não se pode fazer de conta que isso não existe. Você não pode fantasiar reformas e regulações leves aqui e acolá. Imaginar que Barack Obama vai abandonar a posição dominante de que os EUA dispõe, nesse sentido – apoiada pela dominação militar – é um erro.

SRKarl Marx chamou a classe dominante de “bando de irmãos guerreiros”. Você acha que a classe dominante vai trabalhar junta, internacionalmente, para encontrar uma solução?

IM – No passado o imperialismo envolveu muitos atores dominantes que asseguraram seus interesses mesmo às custas de duas horrendas guerras mundiais no século XX. Guerras parciais, não importa o quão horrendas são, não podem ser comparadas ao realinhamento do poder e da economia que seria produzido por uma nova guerra mundial.

Mas imaginar uma nova guerra mundial é impossível. É claro que ainda há alguns lunáticos no campo miliar que não negariam essa possibilidade. Mas isso significaria a destruição total da humanidade.

Temos de pensar as implicações disso para o sistema capitalista. Era uma lei fundamental do sistema que se uma força não pudesse ser assegurada pela dominação econômica você recorreria à guerra.

O imperialismo global hegemônico tem sido conquistado e operado com bastante sucesso desde a Segunda Guerra Mundial. Mas esse tipo de sistema é permanente? É concebível que nele não surjam contradições, no futuro?

Algumas pistas vem sendo dadas pela China de que esse tipo de dominação econômica não pode avançar indefinidamente. A China não será capaz de seguir financiando isso. As implicações e consequencias para a China já são bastante significantes. Deng Xiaoping uma vez disse que a cor do gato – seja ele capitalista ou socialista – não importa, desde que ele pegue o rato. Mas e se, no lugar da caçada feliz do rato se termine numa horrenda infestação de ratos de desemprego massivo? Isso está acontecendo agora na China.

Essas coisas são inerentes nas contradições e antagonismos do sistema capitalista. Portanto, temos de pensar em resolvê-los de uma maneira radicalmente diferente, e a única maneira é uma genuína transformação socialista do sistema.

SR - Não há em parte alguma do mundo econômico desacoplamento dessa situação?

IM- Impossível! A globalização é uma condição necessária do desenvolvimento humano. Desde que o sistema capitalista se tornou claramente visível Marx teorizou isso. Martin Wolf, do Financial Times tem reclamado de que há muitos pequenos, insignificantes estados que causam problemas. Ele argumenta que seria preciso uma “integração jurisdicional” , em outras palavras, uma completa integração imperialista – um conceito fantasia. Trata-se de uma expressão das contradições e antagonismos insolúveis da globalização capitalista. A globalização é uma necessidade, mas a forma em que é exequível e sustentável é a de uma globalização socialista, com base nos princípios socialistas da igualdade substantiva.

Ainda que não haja desacoplamento na história do mundo, é concebível que isso não signifique que em toda fase, em todas as partes do mundo, haja uniformidade. Muitas coisas diferentes estão se desenvolvendo na América Latina, em comparação com a Europa, para não mencionar o que eu já assinalei sobre a China, o Sudeste Asiático e o Japão, que está mergulhado em problemas mais profundos.

Vamos pensar no que aconteceu há pouco tempo. Quantos milagres tivemos no período do pós-guerra? O Milagre Alemão, o Milagre Brasileiro, o Milagre Japonês, o Milagre dos cinco Tigres Asiáticos? Engraçado que todos esses milagres tenham se convertido na mais terrível realidade prosaica. O denominador comum de todas essas realidades é o endividamento desastroso e a fraude.

Um dirigente de um fundo hedge foi supostamente envolvido numa farsa envolvendo 50 bilhões de dólares. A General Motors e outras estavam pedindo ao governo norte-americano somente 14 bilhões de dólares. Que modesto! Eles deveriam ter dado 100 bilhões. Se um fundo hedge capitalista pode organizar uma suposta fraude de 50 bilhões, eles devem chegar a todos os fundos possíveis.

Um sistema que opera nesse modo moralmente podre não pode provavelmente sobreviver, porque é incontrolável. As pessoas chegam a admitir que não sabem como isso funciona. A solução não é desesperar-se, mas controlá-lo em nome da responsabilidade social e de uma radical transformação da sociedade.

SRA tendência inerente do capitalismo é exigir dos trabalhadores o máximo possível, e isso é claramente o que os governos estão tentando fazer na Grã Bretanha e nos EUA.

IM – A única coisa que eles podem fazer é advogar pelos salários dos trabalhadores. A razão principal pela qual o Senado recusou a injetar 14 bilhões de dólares nas três maiores companhias de automóveis é que não puderam obter acordo sobre a drástica redução dos salários. Pense no efeito disso e nos tipos de obrigações que esses trabalhadores têm – por exemplo, repagando pesadas hipotecas. Pedir-lhes que simplesmente passem a receber metade de seus salários geraria outros tipos de problemas na economia – de novo, a contradição.

Capital e contradições são inseparáveis. Temos de ir além das manifestações superficiais dessas contradições e de suas raízes. Você consegue manipulá-las aqui e ali, mas elas voltarão com uma vingança. Contradições não podem ser jogadas para debaixo do tapete indefinidamente, porque o carpete, agora, está se tornando uma montanha.

SRVocê estudou com Georg Lukács, um marxista que retomou o período da Revolução Russa e foi além.

IM – Eu trabalhei com Lukács sete anos, antes de deixar a Hungria em 1956 e nos tornamos amigos muito próximos até a sua morte, em 1971. Sempre nos olhamos nos olhos – é por isso que eu queria estudar com ele. Então aconteceu que quando eu cheguei para estudar com ele, ele estava sendo feroz e abertamente atacado, em público. Eu não aguentei aquilo e o defendi, o que levou a todos os tipos de complicações. Logo que deixei a Hungria, fui designado sucessor, na universidade, ensinando estética. A razão pela qual deixei o país foi precisamente porque estava convencido de que o que estava acontecendo era uma variedade de problemas muito fundamentais que o sistema não poderia resolver.

Eu tentei formular e examinar esses problemas em meus livros, desde então. Em particular em "A Teoria Alienação em Marx" e "Para Além do Capital" (*). Lukács costumava dizer, com bastante razão, que sem estratégia não se pode ter tática. Sem uma perspectiva estratégica desses problemas você não pode ter soluções do dia-a-dia. Então eu tentei analisar esses problemas consistentemente, porque eles não podem ser simplesmente tratados no nível de um artigo que apenas relata o que está acontecendo hoje, ainda que haja uma grande tentação de fazê-lo. No lugar disso, deve ser apresentada uma perspectiva histórica. Eu venho publicando desde que meu primeiro ensaio justamente substancial foi publicado, em 1950, num periódico literário na Hungria e eu tenho trabalhado tanto como posso, desde então. À medida de nossos modestos meios, damos nossa contribuição em direção da mudança. Isso é o que tenho tentado fazer ao longo de toda minha vida.

SR- O que você pensa das possibilidades de mudança neste momento?

IM – Os socialistas são os últimos a minimizar as dificuldades da solução. Os apologistas do capital, sejam eles neokeynesianos ou o que quer que sejam, podem produzir todos os tipos de soluções simplistas. Eu não penso que podemos considerar a crise atual simplesmente da maneira que o fizemos no passado. A crise atual é profunda. O diretor substituto do Banco da Inglaterra adimitiu que esta é a maior crise econômica na história da humanidade. Eu apenas acrescentaria que esta não é apenas a maior crise na história humana, mas a maior crise em todos os sentidos. Crises econômicas não podem ser separadas do resto do sistema.

A fraude e a dominação do capital e a exploração da classe trabalhadora não podem continuar para sempre. Os produtores não podem ser postos constantemente e para sempre sob controle. Marx argumenta que os capitalistas são simplesmente personificações do capital. Não são agentes livres; estão executando imperativos do sistema. Então, o problema da humanidade não é simplesmente vencer um bando de capitalistas. Pôr simplesmente um tipo de personificação do capital no lugar do outro levaria ao mesmo desastre e cedo ou tarde terminaríamos com a restauração do capitalismo.

Os problemas que a sociedade está enfrentando não surgiram apenas nos últimos anos. Cedo ou tarde isso tem de ser resolvido e não, como o vencedor do Prêmio Nobel deve fantasiar, no interior da estrutura do sistema. A única solução possível é encontrar a reprodução social com base no controle dos produtores. Essa sempre foi a idéia do socialismo.

Nós alcançamos os limites históricos da capacidade do capital controlar a sociedade. Eu não quero dizer apenas bancos e instituições financeiras, ainda que eles não possam controlá-las, mas o resto. Quando as coisas dão errado ninguém é responsável. De tempos em tempos os políticos dizem: “Eu aceito total responsabilidade” , e o que acontece? Eles são glorificados. A única alternativa exequível é a classe trabalhadora, que é a produtora de tudo o que é necessário em nossa vida. Por que eles não deveriam controlar o que produzem? Eu sempre enfatizei em todos os livros que dizer não é relativamente fácil, mas temos de encontrar a dimensão positiva.

István Mészàros é o autor do recentemente publicado "The challenge and burden of Historical Time", "Os Desafios e o Fardo do Tempo Histórico", publicado no Brasil pela Boitempo Editorial, 2007.

(*) Ambos publicados no Brasil pela Boitempo Editorial.

Artigo originalmente publicado na Socialist Review

Tradução: Katarina Peixoto

Ucrânia: Trabalhadores ocupam a fábrica Kherson

Por Oksana Boiko

Sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Na terça-feira pela manhã, no dia 3 de fevereiro, os trabalhadores da Kherson Machine Building Plant, KNF, (que produz maquinária agricola) ocupou uma das instalações da fábrica. As 9h30m cerca de 300 trabalhadores da KNF adentraram os andares da fábrica e ocuparam o prédio administrativo.

Durante esta ocupação, nenhum dos trabalhadores foram afetados, os guardas de segurança locais não impuseram uma resistência séria. Os trabalhadores tomaram o prédio administrativo e demandou a nacionalização desta empresa ucraniana estratégica, juntamente com a demanda de pagamento dos salários atrasados.

Um trabalhador que tomou parte nesta ação falou aos jornalistas que os trabalhadores não receberam seus salários desde setembro e que eles estão prontos para lutar até a vitória. Os grevistas abordaram os trabalhadores da Lvov Bus Factory [N.T.: fábrica de ônibus] e outras fábricas buscando solidariedade.

Agora os trabalhadores estão no prédio e muitos estão ao lado de fora mobilizados segurando cartazes. De acordo com outras pessoas que visitaram a ocupação, a situação em geral é normal, mas mais e mais pessoas estão vindo para se unir aos grevistas.

Viktor Shapinov, da Corrente Marxista Internacional, que está apoiando a ação dos trabalhadores, explicou que, “neste momento a fábrica está totalmente sob controle operário, a situação está sendo monitorada pelo conselho dos trabalhadores, liderado por Leonid Nemchinov. Aqui não há polícia em volta do prédio”.

De acordo com Shapinov, a decisão de ocupar a fábrica foi tomada após as autoridades recusaram garantir a permissão para uma demonstração [protesto] no centro da cidade de Kherson, onde centenas de trabalhadores do KNF tomaram parte.

“As pessoas não tem qualquer escolha. Eles não receberam nenhum salário desde setembro de 2008. Os salários passados vem no valor de 4,478,000 hryvni (600.000 mil). No último encontro com os gerentes, os empregados foram informados de que os patrões não estão interessados em salvar a fábrica. Quase 1300 trabalhadores podem perder seus postos de trabalho, enquanto o equipamento da fábrica foi movido para o ferro-velho”, explicou Viktor Shapinov.

As principais demandas dos trabalhadores da KNF são: todos os salários devem ser pagos, nacionalização da fábrica sem nenhuma compensação aos patrões, que sabotaram a produção industrial.

O que se seguiu é que podíamos ler na declaração dos trabalhadores da KNF: “Nós demandamos que essa situação emergente seja resolvida em uma semana, ou nós iremos iniciar ações extremas de protesto para proteger nossas famílias do frio e do estorvo. Os efeitos do fechamento desta empresa estratégica pode ser compreendido pelo governo: uma queda nos rendimentos do orçamento, a destruição de mais de mil postos de trabalho, os custos adicionais da importação de máquinas estrangeiras e mais problemas sociais em Kherson”.

Shapinov acrescentou que, “na quinta-feira, os trabalhadores tiveram conversas com o governador (oblast) do distrito de Kherson, mas ali não houve propostas concretas para resolver este problema. As pessoas estão prontas para lutar até o fim”.

Nós devemos recordar que a situação econômica na Ucrânia continua extremamente difícil. Nos últimos meses a produção industrial neste país caiu um terço e continua a cair.

Tradução: Lucas Morais

Por que Yeda acabou com a Escola Itinerante?


mst

20/02/2009

Se me perguntarem quantos prêmios a governadora do Estado recebeu pelo seu trabalho em favor da Educação, sinceramente, não saberia responder. Parece-me que ela, a Yeda Crusius, nunca fez nada de bom para a Educação ao ponto de ser premiada. Mas, quanto ao MST, a resposta é diferente.

O Movimento dos Sem Terra, o MST, já recebeu vários prêmios por seu bom trabalho realizado na área de Educação. Vamos lembrar de, pelo menos, dois. Em novembro de 1999 o MST recebeu o Prêmio Itaú-Unicef Por uma Educação Básica no Campo e em 1995 recebeu o prêmio Por uma Escola de Qualidade no Campo. O MST, um movimento social que muito fez pela educação, acabou entrando em disputa pela questão da educação com uma governadora que nada de bom realizou nesta área. E, com o apoio de uma parcela do Ministério Público, a governadora Yeda venceu a batalha. Os perdedores, nesta batalha, são crianças, cujos pais não tiveram acesso a terra. E agora o poder público nega para seus filhos o direito à educação.

Em se tratando de educação, é inacreditável que uma governadora como esta tenha vencido o MST. Não podemos comparar a importância do MST para a educação com a tranqueira que esta governadora representou para a educação no Rio Grande do Sul. Se andássemos pelos assentamentos perguntando quem aprendeu a ler e a escrever na Escola Itinerante do MST, com certeza encontraríamos milhares de jovens e adultos confirmando com orgulho que foram alfabetizadas numa escola coberta de lona.

A governadora e o Ministério Público deveriam agradecer ao Movimento Sem Terra por tantos milhares de pessoas alfabetizadas na Escola Itinerante. Pessoas que não apenas aprenderam a ler e a escrever, mas descobriram que poderiam reescrever suas histórias e redesenhar a sociedade. São pessoas que aprenderam a ler muito mais que o alfabeto, e sabem compreender a realidade e o que dela deve ser transformado. Os estudantes da Escola Itinerante tiveram aulas de cidadania e não receberam apenas um certificado escolar, mas reconquistaram o título de cidadão consciente, livre e transformador.

É lamentável que o poder público, por pura truculência e perseguição ideológica, tenha acabado com a Escola Itinerante. E o que é pior, isto aconteceu como parte das ações da melancólica ideia de banir o Movimento dos Sem Terra, defendida por um grupo radicalmente ideológico de promotores e procuradores de Justiça do Estado e o governo da Yeda Crusius, do PSDB. Impressionante como que um governo tão manchado pela falta de ética e moralmente destruído, se atreve a tomar uma atitude profundamente impopular como esta de acabar com a Escola Itinerante. Então, fica o questionamento. Por que um governo que não se aguenta a si próprio no lamaçal da corrupção, ainda segue com ações antidemocráticas e com um caráter declaradamente ideológico? Entendemos que este governo não veio para edificar, mas para destruir o que já foi feito como conquista popular.

Ao acabar com a Escola Itinerante, Yeda mostra para que veio. Ela proibiu a educação nos acampamentos do MST porque a "missão" do seu governo é ser uma tranqueira para os movimentos sociais e populares e para o progresso humano e social. Querem enfraquecer a organização do povo, criminalizar as instituições que garantem a vigência da Democracia em nosso Estado. Fechar a Escola Itinerante, vergonhosamente, faz parte da estratégia antidemocrática de criminalizar e até banir o MST no Rio Grande do Sul. Uma atitude dessas, após mais de duas décadas do fim da ditadura militar, nos indica que o governo Yeda e esta parcela do Ministério Público que está com ela, ainda estão com a cabeça, a alma e o coração empedrados com as ideologias da tirania militar que governou o Brasil a partir de 1964 até a poucos anos.

Frei Pilato Pereira é frade capuchinho.

Artigo publicado no Correio do Brasil

Referendo na Venezuela expressa quadro democrático e tendência histórica

Correio da Cidadania



Escrito por Gabriel Brito
19-Fev-2009

No último domingo, 15, Hugo Chávez venceu o referendo que colocava em questão a emenda que permite reeleições ilimitadas. Para analisar o impacto do resultado, o Correio da Cidadania conversou com o jornalista Gilberto Maringoni, para quem Chávez não representa perigo para a democracia, pois, apesar de seus desejos de continuísmo, aumentou consideravelmente a participação popular nas eleições, sendo que se mantêm os direitos civis e a liberdade de imprensa intactos.

O autor do livro "A Venezuela que se inventa" afirma que a qualidade de uma democracia não depende do tempo no poder de um governante, mas sim de como se conduz a sociedade em seu dia-a-dia. Como paralelo, cita governos parlamentaristas europeus cujos líderes também ficaram longo período no poder.

Maringoni, no entanto, alerta para o perigo que se avizinha das economias dos países de governos progressistas da região, muito dependentes das, agora, desvalorizadas commodities. Para ele, o cenário com o qual nos depararemos na Venezuela e em toda a região é uma grande incógnita.

Correio da Cidadania: Encerrado o referendo, o que o resultado significa em si, uma vez que Chávez havia sido derrotado na tentativa anterior de passar a emenda das reeleições ilimitadas?

Gilberto Maringoni: Desde 1998, houve 15 votações na Venezuela, e em todas elas o governo estava sob questão. É uma média superior a uma votação por ano, algo raro de se encontrar em qualquer lugar do mundo. O interessante é que se pegarmos os números dessa vitória do Chávez (59,5%), compararmos com a primeira eleição dele - de 1998 (56% dos votos) e observarmos também as demais votações, vemos que há uma constância, exceto pelo referendo no final de 2007, quando estava colocada a mesma emenda da reeleição ilimitada.

Em primeiro lugar, vemos um traço muito importante. O Chávez na Venezuela representa uma opinião arraigada e consolidada, não se trata de uma votação episódica. Ele oscila um pouco, mas tem mais da metade da sociedade a seu lado. E o interessante é que o índice de abstenção foi baixo, cerca de 70% dos eleitores compareceram, o que na Venezuela é bastante, já que o voto não é obrigatório, pois mesmo sob Chávez houve eleições com comparecimento de 35%, 40%. E com o fim do analfabetismo na Venezuela, o eleitorado cresceu.

Além disso, há o seguinte: onde ele perdeu as eleições de dezembro de 2008, obteve uma votação menor também agora. O referendo expressa um quadro sem fraudes e uma tendência histórica.

CC: Como você avalia a proposição em si? Por que Chávez tomou essa iniciativa?

GM: Primeiramente, devemos observar que isso não significa uma perpetuação garantida no poder, mas sim que ele poderá se candidatar mais vezes. Outra coisa: quem começou com a tendência de abrir a possibilidade de reeleições na América Latina não foi a esquerda, mas sim a direita, através de Menem, Fujimori e FHC. Ademais, o instituto da reeleição em si não indica que um país seja mais ou menos democrático. Os países parlamentaristas europeus têm seus exemplos. Thatcher ficou 11 anos no poder, Felipe González ficou 14, entre outros, chefes de Estado de fato, e que ficaram enquanto tiveram apoio do parlamento.

Na ditadura militar do Brasil os presidentes ficavam cinco anos cada no poder, havia um rodízio entre os generais. Médici, Geisel, Figueiredo, Castelo Branco se alternavam e o país vivia sob uma ditadura. Portanto, não é o tempo de permanência no poder que define alguma coisa, mas sim os métodos e procedimentos de como se democratiza a vida.

A democracia não é um regime perfeito; existem problemas na Venezuela, nos EUA e nos países europeus. Cada lugar tem uma democracia funcionando à sua maneira e a Venezuela é um país em que há separação de poderes, a imprensa trabalha livremente, os direitos civis estão assegurados etc.

Pessoalmente, acho que mesmo com essa possibilidade de reeleições infinitas é positivo que haja uma alternância no poder, que surjam novas lideranças. E reitero que não é uma reeleição ou não que definirá a qualidade de uma democracia, mas sim a dinâmica do dia-a-dia, da luta política e também o surgimento dessas novas lideranças.

CC: Mas o que pensa dos planos de continuidade do Chávez, especificamente, que já aventou até mesmo a hipótese de tentar ficar no poder até 2039?

GM: Não é um problema sério, pois ele pode perder as eleições também. A oposição teve 45% dos votos. Não é uma eleição que representa uma superioridade histórica, de 80%, 90%. E essa história pode se reverter. Como em 2007.

É um direito dele ficar mais tempo, mas não é a mera intenção que definirá isso.

CC: Há algum aspecto positivo nesse continuísmo para a Venezuela e a América Latina?

GM: Eu pessoalmente não acho que o melhor seja a permanência de alguém por muito tempo no poder, é muito bom que haja disputa. Mas isso está garantido na Venezuela, pois não ficou estabelecido que o Chávez ficará no poder até 2039.

Porém, até aqui seu governo foi extremamente positivo para a Venezuela e também para a América Latina. Os indicadores sociais subiram, os salários reais aumentaram, o desemprego caiu... Tudo também foi muito favorecido, obviamente, pela alta do petróleo nos últimos 4, 5 anos, até meados do ano passado.

O grande problema, e por isso o Chávez colocou a votação em jogo agora, é o cenário futuro, de médio prazo, que se apresenta difícil. Para os demais países também, mas no caso da Venezuela há o problema da dependência do petróleo, de uma economia extrativista, cuja extração desse fóssil responde por mais de 70% das exportações do país. A queda do seu preço acarretará sérios problemas, reduzindo os recursos do Estado.

Portanto, os serviços estatais, as missões de bairro, a própria gestão da coisa pública sofrerão muitas dificuldades por conta dessa baixa do petróleo. Eis o grande problema.

Na conjuntura latino-americana a crise econômica coloca uma sinuca para os países da região. Todos os países exportadores de commodities sofrerão conseqüências graves por conta da queda de seus preços.

Os governos progressistas da região estiveram associados a um período de bonança, crescimento e melhoria de vida. A grande incógnita é como será a partir de agora com os resultados da crise e quais serão as conseqüências políticas na Bolívia, Venezuela, Paraguai, Equador e também Brasil.

CC: A emenda não é perigosa no sentido de que, em caso de reviravolta política, mesmo a longo prazo, pode se tornar um instrumento valioso para um governo antipopular?

GM: Sim e não. Porque se for um governo que se submete a eleições, está dentro da regra do jogo.

Quero destacar que não se aumentou o mandato do Chávez até 2039, não foram destruídos os partidos de oposição, que, aliás, está mais ativa no plano institucional do que antes. Isso porque ela aderiu ao jogo institucional, mostrando sua força em 2007, 2008 e agora também.

A democracia está funcionando, e muito por conta de o governo Chávez ter aumentado a participação das pessoas nesse processo.

O número de votantes aumentou praticamente 20% entre 1998 e 2009, um crescimento bem superior ao próprio aumento proporcional da população. A abstenção caiu nos últimos anos, e em grande parte porque a oposição também se inseriu no jogo democrático.

Como o voto não é obrigatório, o governo chama seus apoiadores para votar, mas eles podem não ir. O fato de existir um aumento da votação significa que as pessoas estão mais interessadas em participar do processo político. Não é só uso da máquina, como diz a imprensa. Os dois lados fizeram força para trazer seus eleitores e a disputa se deu voto a voto.

CC: Você acredita, de todo modo, que houve um abuso no uso da máquina governamental por parte do governo?

GM: Não posso afirmar, pois não estive lá. No entanto, pelo que conversei com algumas pessoas, se, de um lado, o governo usa a máquina oficial, a oposição tem à sua disposição todos os canais privados, o capital financeiro e os ricos, todos alinhados a ela. Cada um lançou mão de todos os recursos que tinha ao seu alcance.

Gabriel Brito é jornalista.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Chávez: Triunfaram a verdade e a dignidade do povo venezuelano


CARACAS, 15 Fev (AFP) - A aprovação da emenda constitucional que abrirá para o presidente venezuelano Hugo Chávez a possibilidade de um terceiro mandato é um triunfo "da verdade e da dignidade da pátria", declarou o chefe de Estado após a divulgação dos resultados na noite deste domingo.

A emenda constitucional que propõe a reeleição ilimitada do presidente e demais cargos públicos na Venezuela foi aprovada com 54,36% dos votos, anunciou a presidente do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), Tibisay Lucena.

A oposição conseguiu 45,63% dos votos, segundo este primeiro boletim oficial.

"Queremos felicitar o povo da Venezuela por seu comportamento cívico e democrático no dia de hoje. Foi um dia extraordinário", felicitou Lucena.

A abtenção foi de 32,95%, segundo o CNE.

Reeleições boas e ruins

Escrito por Atilio A. Boron
10-Fev-2009

O expressivo triunfo de Evo Morales, o terceiro consecutivo desde 2005, dificilmente servirá para calar as críticas de quem viu neste referendo constitucional apenas um estratagema do líder boliviano para se perpetuar no poder. Omite-se a densa articulação da nova Constituição boliviana que, em seus 411 artigos, estabelece um marco normativo protetor das grandes maiorias populares, por séculos oprimidas pelos distintos governos locais, ao passo que reafirma os direitos dos povos indígenas, garante o controle público sobre os principais recursos naturais e aperfeiçoa a qualidade das instituições republicanas. Apesar dos cerca de 350 observadores internacionais, de organismos como a OEA, a Unasul, a União Européia e o Centro Carter terem declarado que as eleições se desenvolveram de maneira irretocável, o líder da direita fascista de Santa Cruz, Branco Marinkovic, manifestou sua impotência lançando uma ridícula acusação de fraude, preparando o terreno para uma nova ofensiva insidiosa contra a nova Constituição.

Uma das críticas mais recorrentes, escutada também nos dias que rondaram a proposta de emenda à Constituição da República Bolivariana da Venezuela permitindo a reeleição indefinida do presidente Hugo Chávez, é que tal cláusula revela uma vocação totalitária que deve ser rechaçada a qualquer custo. A secretária de Estado de George W. Bush, Condolezza Rice, não se cansou de aventar essa tese, repetida depois ad nauseam pelos principais meios de imprensa, jornalistas e analistas ‘independentes’ da América Latina. Não se conhecem ainda comentários de sua sucessora, Hillary Clinton, mas, a julgar pelas suas muitas infelizes declarações na sua audiência de confirmação diante do senado dos EUA, não seria de se estranhar que nos próximos dias aparecesse um comunicado oficial deplorando o que seria visto como uma sinuosa manobra de Evo Morales para se eternizar no Palácio Quemado.

Em vista disso, convém recordar que a reeleição indefinida é uma norma na maioria dos países europeus: foi por isso que Helmut Kohl pôde ser chanceler primeiro da República Federal da Alemanha e depois da Alemanha unificada durante 16 anos, de 1982 a 1998, sem que em nenhum momento a opinião ‘bem-pensante’ e a imprensa ‘independente’ (muito menos o Departamento de Estado) esperneassem diante de tão prolongado monopólio do poder político. E poderia ter seguido no timão da chancelaria; só não o fez por conta do estouro de um escândalo que o obrigou a renunciar. Na Espanha, o principal lobista mundial das transnacionais espanholas e sentinela agitador dos valores democráticos, Felipe Gonzalez, foi primeiro-ministro de 1982 a 1996, num total de 14 anos, sem despertar preocupação alguma na Casa Branca e nos governos "democráticos" dos países desenvolvidos. No Reino Unido, Margaret Thatcher foi primeira-ministra durante 11 anos. Nada a impedia de seguir no poder, mas sua coalizão perdeu peso eleitoral e teve de renunciar. Há vários casos similares na Europa. A França, sem ir mais longe, autoriza uma reeleição presidencial para mandatos de sete anos cada. Todos os últimos presidentes franceses duraram 14 anos no poder.

Mais interessante ainda é o silêncio de Washington diante da dilatada permanência no poder de uma série de mandatários amigos, aliados incondicionais do império. No Egito, o atual presidente Mohamed Hosni Mubarak exerce o cargo desde outubro de 1981, o que não o impede de receber toda sorte de elogios pela "estabilidade política" conquistada neste país e generosos apoios financeiros e militares por parte da Casa Branca. Total: 28 anos ininterruptos no poder. Em Camarões, o presidente Paul Byia governa com superpoderes desde 1982, ou 27 anos. No pequeno enclave petroleiro do Gabão, outro aliado dos EUA, o presidente Omar Bongo Ondimba preserva a ordem com mão de ferro desde 1967, isto é, 42 anos. Em Angola, o governo pró-americano de José E. dos Santos encontra-se no poder desde 1979, 30 anos. Por fim, um dos aliados fundamentais dos EUA, a Arábia Saudita, é um país no qual impera o mais primitivo e brutal despotismo: ali vige uma monarquia hereditária que jamais convocou eleições de nenhum tipo, nem sequer para o legislativo, cujos membros são designados a dedo pelo rei Abdallah entre seu séquito de familiares e preferidos. Jamais o Departamento de Estado norte-americano disse alguma palavra acerca das ameaças que a perpetuação de tais regimes significa para o futuro da democracia no mundo. O problema são casos como os de Fidel, Evo e Chávez, não esses outros. Se são úteis aos interesses de Washington poderão permanecer no poder pelo tempo que quiserem e, além do mais, ser respaldados de todas as formas imagináveis. Mas caso se rebelem contra o império são denunciados como déspotas ou tiranos. Enfim, amigos são os amigos.

Atílio Boron

Doutor em Ciência Política
da Universidade de Harvard
professor titular de Teoria Política
na UBA (Universidade de Buenos Aires).

É autor do livro "Império e Imperialismo.
Uma leitura crítica de Michael Hardt
e Antonio Negri", publicado
pela editora CLACSO em 2002.

Trazido por Gabriel Brito,
jornalista.

Sem explosão social, não haverá saída para a sociedade’

Escrito por Gabriel Brito
10-Fev-2009

Por conta de uma manifestação popular que tomou proporções inesperadas, com confrontos entre moradores e policiais, a favela do Paraisópolis, uma das maiores do continente, encontra-se sitiada por uma imensa operação militar para controle dos distúrbios.

Para analisar a situação, o Correio da Cidadania conversou com o deputado estadual Carlos Gianazzi. Na visão do parlamentar do PSOL, o fato de todo o caos ter sido deflagrado a partir da morte de um jovem evidencia que há complexos ingredientes em meio a explicações simplificadoras, que atribuem tais revoltas à ação do crime organizado ou à mera iniqüidade popular.

Giannazi acusa o governo de não possuir uma real política de segurança pública, que se restringiria a ações imediatas, sem atacar os determinantes da miséria, razão maior dos distúrbios. A prática de uma política de ‘higienização’ da cidade, que consiste em desalojar parcelas carentes da população e despachá-las para a periferia, seria uma dessas ações.

Em tempos de crise, o deputado acredita que somente através de explosões sociais, mesmo que localizadas, o governo começará a atender às demandas da população, carente de infra-estrutura e renda em diversos locais da capital e do estado de São Paulo. "Caso contrário, ainda teremos muitos Paraisópolis pela frente, cada vez mais".


Correio da Cidadania: A presente operação policial, com centenas de viaturas e oficiais, na favela do Paraisópolis caracteriza que estado de coisas na cidade?

Carlos Giannazi: Primeiramente, acreditamos que o Estado deve garantir a segurança da população. Tenho acompanhado alguns trabalhos feitos na favela de Paraisópolis, inclusive de escolas da região, com professores, alunos, pais e, enfim, é uma região que possui uma intensa vida social, política e até econômica.

No entanto, foi muito estranho a dimensão do ocorrido. Em nossa opinião, em conversas com quem mora lá, foi algo muito pontual. Houve um enfrentamento de alguns grupos com a polícia e toda a polêmica foi causada em seguida. O que nos preocupa agora na intervenção da PM, de importante função na situação, é que a favela se encontra num estado de sítio. Inclusive, moradores inocentes têm sido prejudicados, sendo tratados como bandidos.

Defendemos que a PM trabalhe no combate ao crime, principalmente organizado e do narcotráfico, presente tanto lá como em outros lugares. No entanto, a polícia colocou um enorme aparato que serve apenas para impressionar a opinião pública e, em especial, os moradores do Morumbi, bairro que representa e abriga parte da elite da cidade, com grandes condomínios, mansões e muito luxo.

E há o lado curioso: grande parte da população da favela trabalha nesses condomínios, como empregados, porteiros e jardineiros, sem contar que na região também se localiza o palácio do governo.

Acreditamos que o governo fez uma intervenção dessa envergadura não tanto para combater o crime organizado, mas, sobretudo, para mostrar à opinião pública e imprensa que tem o controle da situação. Duvido que numa outra favela, na periferia distante, o governo teria o mesmo comportamento.

CC: Como avalia a política de segurança do governo, especialmente no que diz respeito à secretaria de segurança, representada por Ronaldo Marzagão?

CG: É um verdadeiro fracasso. Não há política de segurança pública no estado, o que ficou evidenciado na greve da Polícia Civil, que ficou mais de 60 dias paralisada, expondo para a opinião pública toda a falta de estrutura e o sucateamento da instituição, que trabalhava sob condições até desumanas.

A própria Polícia Civil mostrou à população que não há segurança pública. E foi tão grave que o próprio governador ordenou à PM, através da tropa de choque, que enfrentasse e espancasse os policiais civis que protestavam em frente ao Palácio dos Bandeirantes.

Portanto, estamos à deriva na área de segurança pública no estado de São Paulo, pois não se percebe a existência de tal política.

CC: A truculência estatal para lidar com a população excluída não pode ser benéfica para o próprio crime organizado, que pode canalizar para si a fúria popular local, aumentando sua influência e até credibilidade entre os moradores?

CG: Certamente. Essa truculência não leva a nada. Uma coisa é repressão ao crime organizado, ao narcotráfico, aos criminosos em geral. É importante e defendemos essa política, da ação preventiva, de repressão ao crime e, sobretudo, de ação da polícia científica, inteligente. Essa sim pode desmontar o crime organizado e efetuar a prevenção. Mas como isso praticamente não existe, podemos dizer que estamos mesmo à deriva.

CC: Paraisópolis, segunda maior favela paulistana, é uma das localidades que mais receberam projetos assistenciais, de diversas origens, nos últimos anos e mesmo assim pouco se viu mudar em sua cruenta realidade. O confronto dos moradores com a polícia após a morte do jovem, estopim de tudo, não escancara a ineficácia e esterilidade dessas políticas nas comunidades carentes?

CG: Sem dúvida. Até porque o trabalho assistencialista, apesar de seus méritos, não ataca as principais causas da violência na nossa sociedade, inclusive em Paraisópolis, que são a desigualdade social, a falta de mobilidade social, agora a crise econômica...

Em meio a tal situação, os programas assistenciais de ONGs, empresas e pessoas de boa vontade não dão conta, tamanha a desigualdade em nosso país, especialmente em Paraisópolis, que vive um grande paradoxo: de um lado a favela, com 80 mil habitantes; do outro, um dos bairros mais ricos da América latina, com moradores que detêm grande parte do PIB nacional.

Portanto, somente programas assistenciais não resolvem a situação. Precisamos realizar uma verdadeira reforma na sociedade brasileira, na economia e na distribuição de renda. Isso, sim, começaria a amenizar a questão da criminalidade e da degradação social. Se não se mexer nesse ponto, não se resolverá nada.

CC: Não se abre a necessidade ou oportunidade de a esquerda e movimentos sociais se aproximarem de tais comunidades e fazê-las despertar para uma luta social mais ampla e conscientizada? Existe este tipo de incursão, de forma efetiva, nessas áreas urbanas?

CG: Na verdade, já se faz um pouco disso. No PSOL, temos um trabalho, principalmente na periferia da cidade, com setores populares mais massacrados, no sentido de desenvolver uma consciência política e crítica, para que a população reaja. Porém, fazemos esse trabalho no sentido político, não no assistencial. Estamos realizando tal trabalho pelo desenvolvimento do senso crítico; não no sentido partidário, mas para que o morador de uma periferia entenda sua condição e se conscientize de que pode alterá-la através da mobilização social, do processo coletivo. Rompendo as estruturas, mas sempre coletivamente, pela organização e pressão sobre o Estado brasileiro.

Temos vários trabalhos nessas áreas, em parceria com os movimentos de moradia, de defesa da saúde pública, da educação gratuita, isto é, movimentos de conscientização através dos quais a população entra em contato com seus direitos constitucionais.

CC: Sabe-se que a favela fica em meio a bairros de alto padrão e que possui vias de acesso para lugares públicos de relevância na metrópole, como o estádio do Morumbi, local de difícil entrada e saída. Lembrando que há uma campanha pelo estádio do Morumbi como sede paulista da Copa de 2014 a todo vapor, estaríamos já diante de sorrateiros prenúncios dos recorrentes desalojamentos da população, para ‘limpar a área’ dessa comunidade e assim dar início às obras necessárias para o evento?

CG: Com certeza. O governo já tem como política a idéia de higienização da população pobre. O governo não ataca as causas da pobreza, ataca os pobres. Não ataca as causas da miséria, mas sim as vítimas dela. E afastar e esconder essas pessoas na periferia faz parte do processo. Essa tem sido uma tendência do governo Serra e do prefeito de São Paulo Gilberto Kassab. Sendo que a política de criminalização dos movimentos sociais e higienização da população é mais intensa na capital.

Eu não tenho dúvidas de que por trás dessa forte repressão - pelo menos aparente, com viaturas nas ruas, policiais aos montes - está também a Copa do Mundo, com a polícia controlando qualquer manifestação popular na região.

Só iremos resolver a questão da segurança pública investindo recursos do Estado no combate à desigualdade social, na distribuição da renda, na execução da reforma agrária. Caso contrário, ainda teremos muitos Paraisópolis pela frente, cada vez mais.

Em Americanópolis, já houve distúrbios neste último final de semana, uma região pobre que foi vítima do abandono do governo, cuja falta de infra-estrutura levou a uma justa revolta da população. Uma mulher morreu dentro de casa vítima de uma enchente, produto da leviandade e incompetência da atual prefeitura, que começou com uma obra na região, não terminou e permitiu que uma vida fosse ceifada pela cheia de um córrego.

CC: Sendo assim, podemos estar diante de um coquetel perigoso. Em tempos de crise e aumento do desemprego, excessivas repressões do governo poderão provocar verdadeiras explosões sociais, a seu ver?

CG: É, acho que a população terá que explodir mesmo. A única maneira de o governo e o poder público reagirem e canalizarem gastos públicos para demandas da população é através da explosão.

A sociedade terá de se mobilizar e se manifestar de diversas maneiras, de preferência pacificamente. Às vezes não é possível, pois ela é jogada nesse processo de violência e responde da mesma maneira.

Porém, se não houver explosão social, não haverá saída para a sociedade brasileira.

Gabriel Brito
jornalista

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Infernópolis: o pecado de ser pobre

Ricardo Alvarez
Ação da Polícia Militar de SP na segunda maior favela da cidade peca pela agressividade contra pobres e o direito de protestar, mistifica a origem dos confrontos e alimenta a idéia de "limpeza social".
Tudo começou com o atropelamento e morte de um garoto que teve duplo azar na vida: nasceu pobre e morreu nos primeiros anos de sua frutífera vida. Seguiu-se ao acidente uma manifestação dos moradores por equipamento público, para coibir novas mortes. Nada mais justo e compreensível.
Na manifestação ocorreram quebradeiras provocadas por garotos que não têm muito a perder, mas não contavam com o apoio dos manifestantes e da Associação de Moradores. Quando se vive no limite, relegado a uma mobilidade restrita numa metrópole repleta de possibilidades, sem a presença efetiva de equipamentos públicos de qualidade, assombrado pela violência, pelo desemprego, miséria, álcool e rendimentos risíveis, a fronteira entre o legal e o ilegal é muito tênue. Não se trata simplesmente de "desvio de caráter", ou de vandalismo inconsequente como parte da imprensa e a própria SSP fez crer. Mas o teatro estava apenas no começo.
Paraisópolis é uma grande mancha urbana de pequenos casebres, alta densidade demográfica e com indicadores sociais perversos: apenas 0,45% dos jovens entre 18 e 24 anos estão no ensino superior. Em 1991 o índice era de 1,19%. Apenas 20% do mesmo grupo social estão no ensino médio (Moema tem percentual de 84%) e a baixa escolaridade colabora no desemprego: 1 em cada 4 adultos está sem trabalho. A renda média entre seus moradores é de R$ 367,00 ao passo que na cidade de São Paulo o valor chega a R$ 1.325,00. A degradação persistente da qualidade de vida destas pessoas desceu em profundidade abissal.
Ao seu redor encontramos situação inversa: cercada de edifícios majestosos, casas de alto padrão, com imensos terrenos gramados e arborizados, seguranças particulares e abastecidos de total infra-estrutura. Seus vizinhos gastam mais dinheiro num ano em manutenção das piscinas do que o Estado em educação a estes deserdados urbanos.
Cito esta contradição explícita na paisagem da geografia local para reforçar a idéia de que o convívio permanente entre os socialmente desiguais é sempre explosivo, apesar da repetitiva ladainha que o problema reside na personalidade das pessoas, que a delinqüência vem de berço e a violência está no sangue de alguns. Tolos, não percebem que este mesmo discurso embala as políticas de segurança pública há décadas sem solução definitiva.
Também não façamos coro com a tese dos "dois Brasis", pois as relações entre estes dois mundos são próximas. Trabalhar com o doméstica nestas residências é uma das principais fontes de empregos para as mulheres de Paraisópolis e o assistencialismo corre solto e evidencia sua incapacidade em apontar saídas: Kaká doou bolas, ONG´s distribuem alimentos e roupas, a BOVESPA montou uma Biblioteca, Colégio de classe alta da redondeza oferece bolsas de estudos, enfim, ações apoiadas em responsabilidade social que não dão conta de suprir a irresponsabilidade social dos governos constituídos.
Quando carros foram atacados, pneus queimados e comércios destruídos, num ato espontâneo de revolta contra uma realidade insuportável, a resposta foi o show da operação policial. Estar rodeado de ricos e, principalmente, muito próximos do Palácio do Governo de São Paulo, habitado e dirigido pelo Sr. José Serra, foi outro baita azar.
Na ótica do governo, era preciso agir e rápido. Primeiro, a desculpa padrão: a culpa é da própria população que protege os traficantes que atacaram a Polícia. Segundo, uma movimentação policial exemplar: desfile de viaturas pela Marginal do Rio Pinheiros mostrando que o Governador não tergiversa, age. Terceiro, a grande mídia entra em cena: como sempre criando cenários que levam a conclusão imediata de que a ação se justifica, e mortos e feridos são inevitáveis.
O mais irônico é que ocupar casas sem mandato de segurança virou rotina, matar jovens suspeitos, uma necessidade e, aterrorizar a população local, um aviso. Minha suspeita é que por detrás deste modus operandi, que se diga não é uma exclusividade de São Paulo, existe uma política mal disfarçada de redução das pressões populacionais por emprego e serviços públicos, que acomete principalmente crianças e adolescentes pelo Brasil afora. São grupos de extermínio institucionalizados e que comumente recebem aplausos de telespectadores confortavelmente instalados diante de seus televisores, e crentes de que o melhor foi feito.
Poderia haver o caminho do diálogo, sem dúvida nenhuma, houvesse interesse do Gabinete do Governador. O Cel. Ailton Araújo Brandão, comandante da ação em Paraisópolis tem, inclusive, folha corrida a este respeito. Ele foi um dos participantes daquela malfadada reunião ocorrida com a cúpula da Polícia Militar de SP e o PCC, em 2006, quando era Comandante da PM na ponta oeste do estado de São Paulo, justamente onde estavam presos os membros da cúpula da organização. Um ano depois recebeu o título de cidadão prudentino, com direito a almoço e placa da honraria pelos serviços prestados.
O Cel. Brandão apontou seu dedo para as novas tecnologias como culpada pelo sumiço de gravações contra a PM pela morte de 104 pessoas nos confrontos com o PCC. O gravador do 190 falhou e o backup automático também falhou.
Mas ele foi condecorado pela Assembléia Legislativa de São Paulo em setembro de 2007 como Comandante do Policiamento da Capital da Polícia Militar do Estado de São Paulo, junto com o Governador Serra. Recebeu importante medalha dos paulistanos, embora o povo de Paraisópolis possivelmente nem saiba que ela exista. Talvez por isso a raiva.
A PF também chegou ao referido Cel. através da Operação Santa Tereza. Em reportagem do jornal O Estado de S. Paulo foi revelado um esquema de distribuição de ingressos para uma festa de peão no interior de São Paulo com artistas consagrados. O "mimo" era a contrapartida pelo oferecimento de segurança pública a um prostíbulo privado que lavava dinheiro do BNDES na capital. Vê-se, portanto, que o crime maior não está em Paraisópolis, mas em outros lugares e o Cel. sabe quais são.
A ação da polícia é a síntese de uma imbricada teia de interesses que passa pela definição, a priori, de que pobre em favela é culpado antes de mais nada, de que é preciso fazer alguma coisa contra a criminalidade e é na favela que o tráfico manda. Humilhar pessoas, revistando-as, invadindo suas casas, num show travestido de caça aos traficantes explicita mais do que uma prática condenável, mas um tratamento de choque para um problema social.
A ocupação da favela de Paraisópolis na cidade de São Paulo, neste começo de fevereiro, é emblemática sobre o papel do tucanato diante dos problemas sociais no estado de São Paulo. Para fazer justiça, o Demo Kassab também foi condecorado na Assembléia Legislativa num ambiente agradável e de confraternização.
Pena que enquanto alguns desfrutam deste conto de fadas com dinheiro público outros vivem num inferno constante e são condenados ao castigo da morte lenta e silenciosa. Mesmo vivendo na "cidade do paraíso".
Ricardo Alvarez
Professor e editor do Blog Controvérsia
blog.controversia.com.br

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Plenária Frente Popular Contra o Aumento da Passagem

Convocatória da Plenária por uma:

FRENTE POPULAR CONTRA O AUMENTO DAS PASSAGENS!

Quando? DIA 10 de FEVEREIRO de 2009.

Que Hora? 18h30

Onde? Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas e Região,

rua: Dr. Quirino 560 - Centro

7 motivos para ir nesta plenária:

1) Com o aumento das passagens, aumenta também o número de pessoas que optam pelo transporte individual, por ser mais confortável e economicamente melhor. Contribuindo para o aumento de emissão de CO2 e por conseqüência para intensificação da CRISE AMBIENTAL e o AQUECIMENTO GLOBAL.

2) Com o aumento das passagens, o DESEMPREGO e o SUBEMPREGO também aumenta e a carência do povo também.

3) Com o aumento das passagens, a CRISE ALIMENTAR cresce, pois sem dinheiro para se transportar, a saída encontrada pelos trabalhadores é reduzir a cesta básica e apertar o orçamento.

4) Com o aumento das passagens, cada centavo reajustado, aumenta proporcionalmente o NÚMERO DE TRABALHADORES QUE ACABAM INDO MORAR NAS RUAS.

5) Com o aumento das passagens, O ACESSO E A PRODUÇÃO DE CULTURA E ARTE são restringidos.

6) Com o aumento das passagens, A SAÚDE DO POVO PIORA MUITO! Acesso aos hospitais, pronto-socorros e centro de saúde passam a ser garantido apenas para os que podem pagar os abusivos preços das tarifas de ônibus.

7) Com o aumento das passagens, A EVASÃO ESCOLAR CRESCE! O CONHECIMENTO PASSA A SER LIMITADO AO IR À ESCOLA.

Toda forma de informação e produção de conhecimento ficam restringidos aos meios de (DES)infomação (TV`S, rádio e jornais).

Propomos: construir uma ampla frente popular de luta contra o aumento, para questionar a privatização desses direitos e lutar um novo modelo de transporte realmente público!

PELA REDUÇÃO IMEDIATA DAS TARIFAS!

PASSE-LIVRE JÁ!

ESTATIZAÇÃO DE TODO O TRASNPORTE COLETIVO, COM CONTROLE POPULAR!

REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO DOS MOTORISTAS COBRADORES, SEM REDUÇÃO DE SÁLARIOS!

Partido na rua: contra o aumento da passagem!

O PSOL/SP realizará na próxima segunda, 09/02, a partir das 11h30, uma agitação política no Vale do Anhangabaú contra o aumento das tarifas do metrô e trem. A passagem deve passar de 2,40 para 2,55.
Neste momento de crise que estamos vivendo, com alta das demissões, tal aumento onera ainda mais os trabalhadores/as. Só a mobilização pode conter tais ataques.
Fernando Gameiro
Secretaria de Organização PSOL/SP

Guarulhos: 2,50 não dá - Transporte Público Já!

Carta Convite aos Movimentos Populares, Sindicais, Estudantis e Classistas da Cidade de Guarulhos, sobre a mobilização pelo Transporte Público e em relação ao valor do mesmo.

Guarulhos não possui transporte PÚBLICO – partindo desta afirmação, propomos a mobilização de amplos setores de lutadores sociais, estudantis, populares e sindicais com o intuito de conscientizar a população da necessidade da construção de um poderoso movimento para se contrapor ao cartel do transporte em nossa cidade, o cartel GUARUPAS.

“R$2,50 não dá mesmo!”, foi nossa primeira palavra de ordem. Com as primeiras atividades, percebemos a disposição da população em encampar esta luta, com o avanço da crise internacional, a discussão sobre a estatização (municipalização) dos transportes, o passe livre, inicialmente para estudantes e desempregados, associado à gradual redução da tarifa até atingirmos a TARIFA ZERO, o PASSE LIVRE para Todos, acessibilidade para portadores de deficiência, idosos, obesos, grávidas, lactantes e pessoas com crianças de colo, pode e deve ser um canal para discutirmos com a classe trabalhadora a necessidade de mudanças radicais nas relações sociais como única maneira de superar as crises, superando o próprio capitalismo.

A crise ambiental que ameaça a existência da humanidade só poderá ser superada se desde já mudarmos as atitudes em relação, dentre outras coisas, às emissões de gazes do efeito estufa. Neste ponto a construção de um sistema de transportes efetivamente PÚBLICO, de qualidade e com tarifa zero será fundamental.

Algumas organizações e militantes tem se reunido e lutado para construir algumas propostas na efetivação deste movimento. Já foram organizadas panfletagens e debates, mas, a nosso ver, o grande passo nessa batalha pela construção do processo de conscientização, a partir de uma luta prática e direta, será a realização de um grande PLEBISCITO POPULAR para discutir com conteúdo nossas propostas para a população. Propomos como período ideal para este, o intervalo entre 1 de Março e 1 de Abril de 2009; durante este período, além da coleta de votos e assinaturas, panfletagens, manifestações de rua, debates, textos e cartas nos jornais, colagens, intensa divulgação no interior das organizações que compões este Comitê 2,50 não dá - Transporte Público Já! –, essa maratona de atividades deverá culminar em um grande ato na câmara municipal, onde com carro de som, entregaremos os resultados para a edilidade e para a imprensa. Ressaltamos que não temos nenhuma ilusão junto à vereança ou à prefeitura de Guarulhos, sabemos que só com a efetiva mobilização conseguiremos vitórias para nossa classe.

Atacar a Guarupass, denunciar este cartel é um compromisso fundamental para nós, passando do tradicional ataque ao poder público e atacando a corja que, privatizando o transporte que deveria ser público, priva a população do direito fundamental de ir e vir, fazendo com que, em Guarulhos, só tenha liberdade quem puder pagar por ela!

Até o momento, as discussões e propostas estão neste pé, aguardamos todos os lutadores, todos aqueles que não se rendem diante das adversidades e são solidários a esta luta que é de todos nós: trabalhadores e trabalhadoras.


A próxima reunião do Comitê será dia 14 de fevereiro de 2009, às 16:00



Local: SINPRO-Guarulhos (Sindicato dos Professores e Professoras) Rua Maria Lucinda N° 53 Vila Zanardi, Guarulhos – SP. (Prox. Ao Hotel Meliá Conffort).

Proposta de Pauta:

à Apresentação e História do Movimento.

à Debate sobre a situação do transporte público.

à Proposta do Plebiscito Popular em defesa do transporte público, pelo Passe Livre.

à Encaminhamentos e tarefas.

à Confraternização

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Algumas imagens do FSM 2009 Belém

Estou registrando uma pequena seleção de fotos minhas do FSM 2009.
Mais fotografias e uma pequena reflexão no meu blog: um relampiar de indignação

Frente de Esquerda na marcha de abertura do FSM

João Pedro Stedile (MST)
no 6 ° Aniversário do Jornal Brasil de Fato

Aleda Guevara no 6 ° Aniversário do Jornal Brasil de Fato

Representante do Equador no Debate sobre Auditoria
das Dividas na América Latina

Ivan Valente e Babá no Debate sobre Auditoria
das Dividas na América Latina