domingo, 26 de abril de 2009

Primeiro de Maio: Dia de Luta

Ato Primeiro de Maio: Os trabalhadores não vão pagar pela crise!
Local: Praça da Sé, São Paulo - SP
9h - Missa dos Trabalhadores
10h30 - Ato Público

sábado, 25 de abril de 2009

Brasil-Venezuela: O nacional burguês versus o nacional popular


Ouça!:

A Venezuela oferece para o povo brasileiro uma excelente pedagogia do exemplo sobre a possibilidade de se planejar e consolidar um projeto baseado em um plano estratégico de desenvolvimento para uma classe específica: os trabalhadores populares.

O Presidente Chávez e sua equipe de governo tem claro para que grupo prioritário ditas mudanças foram desenhadas. E que táticas e estratégias deverão ser implementadas para que, na luta contra as oposições (nacionais e internacionais), se consiga avançar rumo à execução do projeto proposto.

Aparentemente, em meio à propagação discursiva do fim do socialismo real com a queda do muro de Berlim, a burguesia se projetava no imaginário coletivo nacional e internacional, como fomentadoras única e onipotente de planos de ação de curto, médio e longo prazos.

Mas, em essência, a política institucional em disputa nos processos de transição dos governos democráticos, deve ser manifesta como o espaço de debate, disputa e consolidação do projeto vitorioso, baseado em concretas medidas de realização do projeto com clara intencionalidade de classe.

Chávez e sua equipe consolidaram em 2007 o Plano socialista de desenvolvimento da Nação. Por meio deste plano tornaram explícitas as linhas centrais de sua estratégia socialista de médio e longo prazos.

Isso não quer dizer que não haja contradições, que as coisas estejam resolvidas e que, de inicio, o popular nacional já possa ser considerado revolucionário. Mas tampouco significa que a implementação de suas medidas nos últimos anos não tenha revolucionado as bases burguesas hegemonizadoras do poder no território venezuelano.

Sem dúvida alguma, frente à atual onda neoliberal vivida pelo continente, que tem países e governos como territórios férteis de sua ação, (como o caso brasileiro), tal postura é, além de um avanço, um suspiro possível sobre horizontes a serem alcançados a partir do trabalho concreto de retomada do público sobre o privado e do Estado como representante legítimo e legal de parte substantiva da sociedade.

Em seu plano socialista de desenvolvimento da nação baseado no tripé economia-moral-democracia socialistas, tal plano aprovado e referendado popularmente em 2007, evidencia como alguns povos latinos estão, na prática, explicitando o outro mundo necessariamente possível, a partir da ação planejada de governos pares no processo.

Frente a isso, e com base na realidade brasileira imersa no brutal processo de crise oriunda do histórico pacto burguês no governo, vejamos quais são os principais apontamentos venezuelanos que, em meio a crise, podem ser potencializados na histórica oportunidade de executar novos processos- projetos, populares.

Apontamentos:

1. A centralidade do Estado como interventor direto e indireto na economia. Como interventor direto, cabe ao Estado, retomar sua função de produtor direto nos principais setores estratégicos da economia (telecomunicações, energia, agricultura e petróleo), utilizando, sua gestão e ganhos em prol da sociedade, no que se consideram direitos sociais. Como interventor indireto, cabe ao Estado regular, fiscalizar, tributar progressivamente os setores econômicos em que atuam os capitais (trans)nacionais para que, em um viés nacional popular, quanto mais façam uso dos recursos que pertencem ao território e à sociedade, mais paguem tributos e operem em conformidade com as questões legais instituídas pela constituição nacional. Sem quebras de contratos, sem flexibilização do mundo do trabalho, sem jogadas contábeis que lhes favoreçam e aniquilem a possibilidade de utilização de parte expressiva dos recursos em projetos estruturais.

2. A centralidade do Estado como formulador de políticas públicas estratégicas. Evidenciar o histórico processo de subordinação popular ao projeto liderado pela classe dominante ao longo da história, e especificar, com transparência, o que se quer e como se logrará o que se quer com tal política. A formalização de um número expressivo de trabalhadores informais, o aumento de 20% do salário mínimo, o fomento da escolarização, a retomada de empresas públicas estatais, são alguns dos pontos centrais não assistenciais, estruturais, que dão vida ao plano bolivariano.

3. A centralidade do Estado comunicador em expressa manifestação de democratizar o acesso tanto às informações, quanto à formação consciente do que deve ser cobrado, exigido a partir daquilo que deve ser aniquilado e exposto sobre as históricas mazelas das relações desiguais manifestas em uma sociedade injusta baseada em uma brutal discrepância entre poucos ricos e muitos pobres.

4. A centralidade do Estado e sua clareza tática-estratégica nas relações bi e multilaterais com as demais nações. Aqui são termômetros importantes da forma e do conteúdo das negociações internacionais. Relações mais duras com os hegemônicos, relações mais solidárias com os latinos e relação mais próxima com os pares, são temas diferenciadores do processo de integração latina e retomada da relação cujo fim é a socialização dos fatores e meios de produção.

5. A centralidade do Estado na reformulação da educação e cultura nacionais como fomentadora de uma ética-moral, baseada em outros princípios que não o da concorrência, individualista, gananciosa, classificadora. O pacto do desenvolvimento nacional popular que vai migrando para o socialismo e tem como raízes sólidas mudanças estruturais contidas no marco constitucional, por isso legítimas (os referendos que o digam) e legais (a constituição os respalda).

Podemos não estar falando de imediato de uma ação e projeção socialistas. Mas o nacional popular venezuelano, protagonizado pelo perfil de seu governante e pela soberana vontade popular, nos mostra a diferença significativa entre projeto estrutural e projeto assistencialista.

Enquanto a equipe de governo venezuelana protagoniza a implementação de um projeto estrutural nacional popular, cujos rumos do desenvolvimento estão pautados na democratização e socialização da produção, o governo de cá, vê sua popularidade baixar ou subir com base em projetos assistenciais, nebulosos e cuja dimensão popular parece não romper o círculo vicioso do populismo.

A ruptura com o subimperialismo é possível. Entretanto, para que isso ocorra, é necessário planejar-executar uma política contra-hegemônica que, além de se contrapor à ordem dominante burguesa mundial, concretize um projeto de desenvolvimento e de poder diferenciados. Este pode ser o caso venezuelano. Mas nem em aparência se parece com o caso brasileiro.

09/04/09

Educadora popular, economista, integrante da Consulta Popular-ES

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Estudantes retomam a sede do DCE da USP

BOLETIM DO DCE-LIVRE USP

O espaço, que havia sido fechado pela Reitoria, foi retomado ontem à noite.

Desde 2006, com o argumento de reforma e regulamentação do espaço, a Reitoria manteve a sede do DCE fechada.

Agora, terminada a reforma, a Reitoria simplesmente informou ao DCE que o espaço seria controlado por ela, acabando com a histórica autonomia financeira e política dos estudantes.

Ontem à noite, a assembléia geral dos estudantes da USP, com mais de 400 presentes, decidiu retomar o espaço, que foi ocupado e agora está sob controle estudantil!

Essa ocupação e o primeiro passo na luta em torno dos 3 eixos aprovados na assembléia:

NENHUM CENTAVO A MENOS PARA A EDUCAÇÃO!

A crise econômica vai gerar impactos catastróficos sobre o orçamento da Universidade. O ICMS - cuja parcela é o único sustento das estaduais paulistas - sofreu uma queda na ordem de 20%. Esse cenário anuncia um corte de verbas no nosso orçamento por parte do governo Serra.

ABAIXO A UNIVESP!

No final de 2008 foi aprovado o programa UNIVESP, que aprofunda a precarização da educação através do ensino à distância nas estaduais paulistas.. Aqui na USP já foram criadas 360 vagas de licenciatura em ciências.

ABAIXO A REPRESSÃO!

Para implementar esses ataques, a Reitoria vem encaminhando processos de sindicância contra estudantes e funcionários devido a greves e à ocupação da Reitoria de 2007, assim como a retirada de espaços estudantis e a demissão do funcionário e diretor do Sintusp, Brandão.


Para barrar esses ataques à universidade, a assembléia apontou a construção de uma grande mobilização unificada das três categorias com perspectiva de uma greve das universidades estaduais paulistas.

Assembléia dos estudantes da USP 6a às 18h na SEDE do DCE entre o bandejão e a Reitoria.

Paralisação unificada de estudantes, funcionários e professores para o dia 5 de maio com realização de ATO unificado.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Capangas de Dantas atacam a balas trabalhadores sem terra

mst

Esclarecimentos sobre acontecimentos no Pará:

Em relação ao episódio na região de Xinguara e Eldorado de Carajás, no sul do Pará, o MST esclarece que os trabalhadores rurais acampados foram vítimas da violência da segurança da Agropecuária Santa Bárbara. Os sem-terra não pretendiam fazer a ocupação da sede da fazenda nem fizeram reféns. Nenhum jornalista nem a advogada do grupo foram feitos reféns pelos acampados, que apenas fecharam a PA-150 em protestos pela liberação de três trabalhadores rurais detidos pelos seguranças. Os jornalistas permaneceram dentro da sede fazenda por vontade própria, como sustenta a Polícia Militar. Esclarecemos também que:

1- No sábado (18/4) pela manhã, 20 trabalhadores sem-terra entraram na mata para pegar lenha e palha para reforçar os barracos do acampamento em parte da Fazenda Espírito Santo, que estão danificados por conta das chuvas que assolam a região. A fazenda, que pertence à Agropecuária Santa Bárbara, do Banco Opportunity, está ocupada desde fevereiro, em protesto que denuncia que a área é devoluta. Depois de recolherem os materiais, passou um funcionário da fazenda com um caminhão. Os sem-terra o pararam na entrada da fazenda e falaram que precisavam buscar as palhas. O motorista disse que poderia dar uma carona e mandou a turma subir, se disponibilizando a levar a palha e a lenha até o acampamento.

2- O motorista avisou os seguranças da fazenda, que chegaram quando os trabalhadores rurais estavam carregando o caminhão. Os seguranças chegaram armados e passaram a ameaçar os sem-terra. O trabalhador rural Djalme Ferreira Silva foi obrigado a deitar no chão, enquanto os outros conseguiram fugir. O sem-terra foi preso, humilhado e espancado pelos seguranças da fazenda de Daniel Dantas.

3- Os trabalhadores sem-terra que conseguiram fugir voltaram para o acampamento, que tem 120 famílias, sem o companheiro Djalme. Avisaram os companheiros do acampamento, que resolveram ir até o local da guarita dos seguranças para resgatar o trabalhador rural detido. Logo depois, receberam a informação de que o companheiro tinha sido liberado. No período em que ficou detido, os seguranças mostraram uma lista de militantes do MST e mandaram-no indicar onde estavam. Depois, os seguranças mandaram uma ameaça por Djalme: vão matar todas as lideranças do acampamento.

4- Sem a palha e a lenha, os trabalhadores sem-terra precisavam voltar à outra parte da fazenda para pegar os materiais que já estavam separados. Por isso, organizaram uma marcha e voltaram para retirar a palha e lenha, para demonstrar que não iam aceitar as ameaças. Os jornalistas, que estavam na sede da Agropecuária Santa Bárbara, acompanharam o final da caminhada dos marchantes, que pediram para eles ficarem à frente para não atrapalhar a marcha. Não havia a intenção de fazer os jornalistas de “escudo humano”, até porque os trabalhadores não sabiam como seriam recebidos pelos seguranças. Aliás, os jornalistas que estavam no local foram levados de avião pela Agropecuária Santa Bárbara, o que demonstra que tinham tramado uma emboscada.

5- Os trabalhadores do MST não estavam armados e levavam apenas instrumentos de trabalho e bandeiras do movimento. Apenas um posseiro, que vive em outro acampamento na região, estava com uma espingarda. Quando a marcha chegou à guarita dos seguranças, os trabalhadores sem-terra foram recebidos a bala e saíram correndo – como mostram as imagens veiculadas pela TV Globo. Não houve um tiroteio, mas uma tentativa de massacre dos sem-terra pelos seguranças da Agropecuária Santa Bárbara.

6- Nove trabalhadores rurais ficaram feridos pelos seguranças da Agropecuária Santa Bárbara. O sem-terra Valdecir Nunes Castro, conhecido como Índio, está em estado grave. Ele levou quatro tiros, no estômago, pulmão, intestino e tem uma bala alojada no coração. Depois de atirar contra os sem-terra, os seguranças fizeram três reféns. Foram presos José Leal da Luz, Jerônimo Ribeiro e Índio.

7- Sem ter informações dos três companheiros que estavam sob o poder dos seguranças, os trabalhadores acampados informaram a Polícia Militar. Em torno das 19h30, os acampados fecharam a rodovia PA 150, na frente do acampamento, em protesto pela liberação dos três companheiros que foram feitos reféns. Repetimos: nenhum jornalista nem a advogada do grupo foram feitos reféns pelos acampados, mas permaneceram dentro da sede fazenda por vontade própria. Os sem-terra apenas fecharam a rodovia em protesto pela liberação dos três trabalhadores rurais feridos, como sustenta a Polícia Militar.

MOVIMENTOS DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA - PARÁ

Lançamento de Frente Parlamentar de Solidariedade a Cuba em SP

PSOL - SP

No próximo dia 29 de abril (quarta-feira), às 19 horas, será lançada a Frente Parlamentar de Solidariedade a Cuba na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. O ato político acontecerá no auditório Franco Montoro (Avenida Pedro Álvares Cabral, 201 - São Paulo). A iniciativa acontece em meio às celebrações do cinqüentenário da Revolução Cubana e foi proposta pelo Deputado Estadual Raul Marcelo, líder do PSOL na Alesp.

Vão compor a mesa do ato de lançamento o embaixador Carlos Trejo Sosa, Cônsul Geral de Cuba em São Paulo; o jornalista e escritor Fernando Morais, autor do livro-reportagem “A Ilha”; o jornalista Gilberto Maringoni; Plínio de Arruda Sampaio, Presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA); Marcelo Chaves, da Associação de Familiares e Amigos de Estudantes em Cuba; Márcia Campos, da Federação Democrática Internacional das Mulheres; Vivian Mendes, do Movimento Paulista de Solidariedade a Cuba; e um dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O evento também contará com a presença de Elza Lobo, lutadora do movimento de solidariedade a Cuba, além de militantes de movimentos sociais, partidos de esquerda e entidades e personalidades amigas de Cuba.
O objetivo da Frente é promover ações de solidariedade com a luta de Cuba pelo fim do bloqueio econômico e comercial imposto ao país desde 1962, e que estabeleceu uma verdadeira guerra econômica contra a opção pelo socialismo feita pelos cubanos. Além de somar esforços na campanha internacional pela soltura dos cinco cubanos antiterrorsitas que estão presos injustamente nos Estado Unidos, a mais de 10 anos, cerceados de direitos básicos como visitas de familiares. A iniciativa busca ainda estreitar as relações entre os povos dos dois países, através de ações de cooperação e de intercâmbio político, cultural, econômico, comercial e científico a partir dos parlamentos Paulista e Cubano.

domingo, 19 de abril de 2009

Pobres no Rio vivem dias de horror

Escrito por Gabriel Brito e Valéria Nader

Estamos na porta de entrada de tempos (ainda mais) difíceis no país. Com crise, desemprego e muita violência nas grandes cidades, os políticos, sem romper seus pactos, precisam apresentar soluções para combater tal quadro. Dessa forma, é produzida uma série de medidas que mais combatem os pobres do que a pobreza. Pintam as paredes, mas não mexem na estrutura interna do ‘prédio’.

Por conta disso, o Rio de Janeiro vem sendo palco de seguidas políticas de limpeza e segregação social, como mostram os choques de ordem e agora o levantamento de muros no entorno de favelas, levados a cabo por prefeitura e governo do estado, respectivamente.

Para a socióloga Vera Malaguti, do Instituto de Criminologia Carioca, o que vemos é a expressão de um fascismo estatal mancomunado com grandes interesses econômicos. O governo pretende levantar 11 mil metros de muros, com 3m de altura, começando pela zona sul, cuja expansão de favelas não chegou à metade do aferido na zona oeste, de 11,5% - dados do Instituto Pereira Passos.

Malaguti aponta que os pobres no Rio de Janeiro são vítimas de crescente truculência oficial e vistos como ‘lixo humano’ que precisa ser removido da cidade, uma vez que a presença dessa parcela da população é prejudicial aos grandes negócios e à especulação imobiliária.

Correio da Cidadania: Como você vê a idéia do governo local de construir muros no entorno de favelas, sob a alegação de preservar algumas áreas verdes da cidade?

Vera Malaguti: É um absurdo e vem junto do circo de horrores do qual vem sendo palco o Rio de Janeiro, através de extermínios da polícia (a que mais mata no mundo), das remoções dos pobres, demolição de casas em áreas populares ilegais...

Enfim, é todo um festival de truculência, em articulação da prefeitura com o governo do estado, completamente ligados aos grandes negócios privados, como os esportivos, e impondo um cerco fascista sobre os pobres. E, além do muro, que é uma vergonha, as remoções voltaram à pauta.

Todo o processo é capitaneado pelas Organizações Globo, com campanha diária no RJTV, no jornal O Globo, sempre focalizando a pobreza como detrito, como algo que conspurca o ambiente. E tudo em nome dos grandes negócios privados, uma vergonha.

O Rio de Janeiro talvez esteja passando pelo seu pior momento desde Lacerda. Parece uma volta com força total da UDN, terrível.

CC: O que pensa do fato de as favelas escolhidas para receberem os primeiros muros se localizarem em bairros mais nobres ou de classe média, mesmo com a expansão recente de tais favelas estando abaixo de índices considerados preocupantes, inclusive em comparação com outras?

VM: Aí fica clara a parceria do governo com a especulação imobiliária, afinal, são áreas nobres, e ter os pobres ali não lhes interessa.

É tão chocante, tão óbvia, essa mistura de truculência fascista com Parcerias Público-Privadas sinistras! Estou sendo enfática, mas é que chegamos num ponto... Ontem mesmo houve o assassinato pela polícia de um menino da Maré, a população tentava protestar e era reprimida da pior forma possível pela mesma polícia. E tudo sempre sob a desculpa do tráfico.

Acho que o fim do brizolismo no Rio foi muito ruim. Para exemplificar, uma das coisas que O Globo fez para comemorar os 45 anos do golpe militar foram acusações levianas sobre o Brizola, ao mesmo tempo em que o associava ao crescimento das favelas. O vazio criado por sua morte, junto ao estraçalhamento das forças de esquerda, deixou o fascismo ocupar a cidade.

CC: Ao se juntar tal ação com a também recente medida dos choques de ordem, vemos que as políticas de higienização nas grandes cidades têm sido levadas ao paroxismo, não?

VM: Exatamente. O velho projeto fascista, com essa maneira de olhar os pobres como lixo humano na cidade, se consolidou, sendo orquestrada também pela grande imprensa tal proposta de apartheid.

Os pobres no Rio de Janeiro vivem dias de horror. Acho que as forças de esquerda, libertárias, precisam se organizar contra isso. Tudo começou pela questão criminal, o que é um problema, pois até a esquerda embarca no discurso de luta contra o tráfico, sempre localizada nas favelas.

Daí para choques de ordem, remoções, muros, é um passo. É um projeto higienista reciclado, em nome da ordem na cidade, dos grandes negócios de Copa, Olimpíadas, dos grandes capitais que circulam no Rio. Tais negócios são uma obsessão para o governo e a prefeitura, que sempre estão em viagem buscando grandes investimentos.

Enquanto isso, pau nos pobres aqui. É um projeto sinistro.

CC: Essas medidas não podem potencializar o ódio entre classes, na medida em que reforçam uma idéia segregacionista?

VM: Claro, isso não vai dar certo. Durante um tempo, algumas forças progressistas do Rio aceitaram a pauta criminal da direita, e assim o fascismo encontrou sua brecha, sendo que acaba se alastrando para a questão habitacional, ambiental, onde muitas vezes se refugia, como neste caso dos muros, aliás.

Uma vereadora do PT foi uma das que mais defenderam os muros, sempre fala em remoções nas favelas da zona sul, como a dos Tabajaras, uma vez que as áreas verdes na cidade se concentram mais na zona sul e posto 9.

Tais equívocos abrem o caminho para o fascismo mais explícito, que vemos nessa mistura de truculência contra os pobres e grandes negócios (com ilegalidades) particulares.

CC: Você acredita que o levantamento dos muros vai impactar de alguma maneira, ainda que a curto prazo, nos índices de criminalidade?

VM: Acho que vai emparedar os pobres e produzir outros efeitos, intra e extramuros. É mais uma grande violência, portanto, entrará nesse moinho gerador de ódios.

Espero que isso possa ser barrado, apesar de todo o esforço da grande imprensa. Fazem pesquisas dizendo que os favelados são favoráveis à remoção, pesquisas para legitimar tais ações... Não deve faltar sociólogo para fazer esse tipo de trabalho e dizer que os pobres estão doidos para serem emparedados e removidos da cidade.

No Rio de Janeiro, neste momento, essas forças, que envolvem institutos de opinião, empresas de publicidade, grande imprensa, setor imobiliário, estão totalmente articuladas na varredura da pobreza da cidade. E da pobreza rebelde, que é uma marca do Rio de Janeiro há muito tempo, pois foi uma cidade quilombola, depois janguista, brizolista...

Estamos diante de um conjunto de interesses escusos, mais uma ‘blitzkrieg’.

CC: Diante do quadro atual, quais medidas seriam efetivas a seu ver, tanto a curto como a longo prazos?

VM: O inverso disso tudo, uma outra maneira de olhar a cidade. Construir políticas habitacionais democráticas, projetos em que as classes populares sejam protagonistas.

Não bastam bons projetos para os pobres, é preciso que esses setores estejam no centro, que a juventude, ao invés de ser criminalizada, seja participante central dos projetos que a libertem dessa concepção de muros, cadeias, extermínio. Temos de produzir outro projeto brasileiro, que não contenha essas conjugações.

É complicado resolver a violência, ninguém tem a solução. Mas uma cidade democrática é gerida de outra forma, e assim produz soluções também democráticas e libertadoras, capazes de permitir que todos usufruam a cidade, apesar das diferenças.

Em suma, é o oposto de tudo isso.

Valéria Nader,

economista, editora do Correio da Cidadania

Gabriel Brito

jornalista

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Massacre de Eldorado de Carajás completa 13 anos sem desfecho


Em 17 de abril de 1996 policiais militares promoveram o Massacre de Eldorado de Carajás, que ganhou repercussão internacional e deixou marca na história do país, ao lado do Massacre do Carandiru (1992) e da Chacina da Candelária (1993), como uma das ações policiais mais violentas do Brasil. Em 2002, o presidente FHC instituiu essa data como o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária.

Passados 13 anos do massacre no Pará, permanecem soltos os 155 policiais que mataram 19 trabalhadores rurais, deixaram centenas de feridos e 69 mutilados. Entre os 144 incriminados, apenas dois foram condenados depois de três conturbados julgamentos: o coronel Mário Collares Pantoja e o major José Maria Pereira de Oliveira. Ambos aguardam em liberdade a análise do recurso da sentença, que está sob avaliação da ministra Laurita Vaz, do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Na próxima semana, o MST monta dois acampamento no estado, para cobrar a condenação dos responsáveis pelo massacre e apoio às famílias sobreviventes, com encerramento das atividades no dia 17. Na Curva do S, em Eldorado de Carajás, 500 trabalhadores rurais participam das atividades do Acampamento da Juventude, a partir do dia 10. Em Belém, 600 pessoas estarão mobilizadas depois do dia 14. "Estamos mobilizados para denunciar que depois de tanto tempo do massacre ninguém foi preso e as famílias ainda não foram indenizadas. Cobramos a indenização de todas as famílias e atendimento médico aos sobreviventes. Defendemos também um novo julgamento para impedir que a morte de 19 companheiros fique impune. Além disso, exigimos a Reforma Agrária para acabar com a violência contra os trabalhadores rurais", explica o integrante da coodenação nacional do MST, Ulisses Manaças.
Em 2007, os trabalhadores Sem Terra conseguiram uma vitória parcial, com a indenização de 23 famílias que foram vítimas do massacre pela governadora Ana Júlia. No entanto, no ano passado o governo estadual promoveu soldados que participaram do Massacre. O Movimento cobra a indenização do total de 79 famílias, além da regularização do atendimento médico multidisciplinar aos feridos durante o massacre, que ficaram com balas alojadas pelo corpo.

“A gente lamenta essa mentalidade de grande parte dos juristas, que acha que a pessoa deve recorrer eternamente, pela chamada presunção de inocência. Esse processo acaba gerando impunidade total e absoluta” afirma o promotor de Justiça do caso, Marco Aurélio Nascimento.

O advogado Carlos Guedes, que acompanhou o caso desde abril de 1996 até o último julgamento, em maio de 2002, acredita que a Justiça ainda não resolveu o caso. Guedes também alerta que existem dois tipos de responsabilidades em relação ao massacre que a Justiça tem de levar em consideração: as responsabilidades criminal e política.

“Se todos os que foram denunciados, desde o coronel Pantoja até o último soldado, tivessem sido condenados, isso por si só seria insuficiente. Outras pessoas tiveram participação decisiva no massacre, como o governador (Almir Gabriel), o comandante geral da Polícia Militar e o secretário de Segurança Pública (Paulo Sette Câmara). Estes sequer foram envolvidos no caso”, contesta o advogado.

Na opinião dos sobreviventes do massacre e dos advogados do MST, a justiça ainda não veio. As pessoas mutiladas, assim como as 13 viúvas que tiveram seus maridos executados naquele dia, ainda não receberam indenizações. Tanto para o coordenador nacional do MST no Pará, Charles Trocate, quanto para os mutilados do massacre, o Estado foi o culpado pelo incidente.

“A cultura da violência gera a cultura da impunidade. Carajás evidenciou um problema em proporções maiores, mas o Estado não foi capaz de criar instrumentos que corrigissem isso. Primeiro se negou julgar e condenar o governador, o secretário de Justiça e o comandante geral da PM. Segundo, nestes 13 anos, não foi produzida nenhuma condenação porque é o Estado que está no banco dos réus”, afirmou Trocate.

O 17 de abril foi marcado como dia internacional da luta das lutas dos camponeses, em homenagem à luta pela terra pelos camponeses de Carajás e de todas as partes do mundo. Todos os anos, a Via Campesina realiza mobilizações nesse período do ano para cobrar o julgamento dos responsáveis pela violência no campo e pela realização da Reforma Agrária.

Caminho do processo na Justiça

Abaixo, leia a cronologia do processo dos envolvidos no Massacre de Eldorado de Carajás.

Junho de 1996 - Início do maior processo em número de réus da história criminal brasileira, envolvendo 155 policiais militares. Em 10 anos, o processo ultrapassou as 10 mil páginas.

16 de agosto de 1999 - Primeira sessão do Tribunal do Júri para julgamento dos réus em Belém, presidida pelo juiz Ronaldo Valle. Foram absolvidos três oficiais julgados - coronel Mário Colares Pantoja, major José Maria Pereira de Oliveira e capitão Raimundo José Almendra Lameira. Foram três dias de sessão com cerceamento dos poderes da acusação, impedimento da utilização em plenário de documentos juntados no prazo legal, permissão de manifestações públicas de jurados criticando a tese da acusação e defendendo pontos de vista apresentados pela defesa.

Abril de 2000 - O Tribunal de Justiça do Estado do Pará determinou a anulação do julgamento, decisão mantida em um segundo julgamento, em outubro de 2000. Antevendo a anulação do julgamento, o juiz Ronaldo Valle solicitou o afastamento do caso. Dos 18 juízes criminais da Comarca de Belém, 17 informaram ao Presidente do Tribunal de Justiça que não aceitariam presidir o julgamento, alegando, na maioria dos casos, simpatia pelos policiais militares e aversão ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e aos trabalhadores rurais.

Abril de 2001 - Nomeada uma nova juíza para o caso, Eva do Amaral Coelho, que designou o dia 18 de junho de 2001 como data para o novo julgamento dos três oficiais. Alguns dias antes do início da sessão, a juíza determinou a retirada do processo da principal prova da acusação, um minucioso parecer técnico da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com imagens digitais que comprovavam que os responsáveis pelos primeiros disparos foram os policiais militares. O MST reagiu e a juíza reviu sua posição, suspendendo o julgamento sem marcar nova data.

14 de maio a 10 de junho de 2002 - O julgamento foi retomado. Após cinco sessões, entre os 144 acusados julgados, 142 foram absolvidos (soldados e 1 oficial) e dois condenados (coronel Pantoja e major Oliveira), com o benefício de recorrer da decisão em liberdade. Em decorrência dos benefícios estendidos aos dois únicos condenados, as testemunhas de acusação não compareceram mais ao julgamento, em função de ameaças de morte e por não acreditar na seriedade do julgamento. Durante vinte dias, jornais do Estado do Pará publicaram detalhes sobre intimidações e ameaças de morte que estariam recebendo as principais testemunhas da acusação, principalmente Raimundo Araújo dos Anjos e Valderes Tavares. Nada foi feito em relação à proteção e salvaguarda de tais testemunhas. O MST não aceitou participar de um julgamento onde não estivessem sequer garantidas a segurança e a tranqüilidade das pessoas fundamentais para a acusação.

Novembro de 2004 - A 2ª Câmara do Tribunal de Justiça do Pará julga numa só sessão todos os recursos da defesa e da acusação e mantém a decisão dos dois julgamentos realizados pelo Tribunal do Júri, absolvendo os 142 policiais militares e condenando o coronel Pantoja (228 anos de prisão) e o major Oliveira (154 anos de prisão).

22 de setembro de 2005 – O coronel Pantoja é posto em liberdade por decisão do Supremo Tribunal Federal.

13 de outubro de 2005 – O major Oliveira é posto em liberdade por decisão do Supremo Tribunal Federal.

2006 - Recurso especial é apresentado ao Superior Tribunal de Justiça e, posteriormente, recurso extraordinário é apresentado ao Supremo Tribunal Federal.

Abril/2007 - A governadora do estado Ana Júlia Carepa assinou decreto que concede indenização e pensões especiais a 22 famílias de trabalhadores sem-terra vítimas da chacina. “O que eu fiz foi reparar uma injustiça, reconhecendo a responsabilidade do governo do Estado”, disse Ana Júlia. A governadora classificou o massacre de Eldorado do Carajás como “um dos episódios que mais envergonhou não só o Pará diante do Brasil, mas o Pará diante do mundo”.

Setembro/2008 - O governo de Ana Júlia Carepa promoveu os soldados que participaram do Massacre de Eldorado do Carajás. Entre 87 e 90 policiais foram promovidos a cabo. Apesar de todos os promovidos já terem sido absolvidos em primeira instância pela acusação de homicídio qualificado, ainda há um recurso no STJ (Supremo Tribunal de Justiça) que pede suas condenações.

Informações à imprensa Igor Felippe - 11-3361-3866 Maria Mello - 61-8464-6176 Mariana Duque - 21-9736-3678

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Contra a volta da chibata


Um século depois da Revolta da Chibata - que em 1910 aposentou os castigos físicos então impostos aos militares navais por força de um motim liderado pelo marinheiro João Cândido - eis que o instrumento de violência física volta à cena, no Rio de Janeiro. Imagens incontestáveis, divulgadas por toda a mídia nesta quarta-feira (16/4), comprovaram que passageiros da Supervia foram tratados a chicotadas. A violência ocorreu em meio a uma greve dos ferroviários.
Em ofício enviado ontem à Supervia, o presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj, Marcelo Freixo, solicitou a entrega de cópia de imagens gravadas pelo sistema de monitoramento interno da concessionária, referentes aos últimos dois meses. Ele pretende verificar se a violência contra passageiros representa prática corriqueira na ferrovia.
A câmera flagrou o momento em que quatro guardas - dispostos ao longo da plataforma de embarque da estação de Madureira, na Zona Norte - usavam como chibatas as cordas de seus apitos. Freixo também perguntou no ofício se era conhecida da concessionária dos serviços ferroviários a prática do emprego de chicotadas no controle dos passageiros. Além disso, o deputado indagou sobre a forma de contratação de seus seguranças e sobre o tipo de treinamento que recebem.
Em função da greve - que envolveu a demissão de maquinistas - o sistema tem funcionado de forma precária, com os trens superlotados. Além de chibatadas, os passageiros sofreram, como provam as imagens, com chutes e socos desferidos pelos seguranças da Supervia. "Trata-se de clara violação dos Direitos Humanos, uma das tantas formas de criminalização da pobreza em nossa sociedade", disse Freixo, que pediu agilidade à Supervia no fornecimento das imagens e informações.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Significado político da greve de fome de Evo Morales


As adesões à greve de fome para forçar o Congresso a aprovar uma nova lei eleitoral se massificaram por toda a Bolívia nos últimos dias. A oposição, que na quinta-feira deixou sem quorum a sessão do Congresso, após a aprovação dos termos gerais da nova legislação eleitoral, negou-se a voltar ao parlamento. “Seguramente, pensaram em me vencer pelo cansaço”, disse o presidente Evo Morales, que já esteve em outras greves de fome desde que ingressou na luta sindical campesina, em 1985.

Pablo Stefanoni

Após as primeiras 30 horas de greve de fome, o presidente da Bolívia, Evo Morales, passou sem problemas pelo primeiro exame médico, realizado pelo ministro da Saúde, e pediu a seus seguidores que suspendam o jejum até a segunda-feira, para não prejudicar as celebrações da Páscoa. No entanto, as adesões à greve de fome para forçar o Congresso a aprovar uma nova lei eleitoral se massificaram em todo o país nos últimos dias. A oposição, que na quinta-feira deixou sem quorum a sessão do Congresso, após a aprovação dos termos gerais da nova legislação eleitoral, negou-se e voltar ao parlamento, apesar dos insistentes pedidos do vice-presidente boliviano e presidente do Congresso, Álvaro García Linera, que se comprometeu a cumprir os acordos firmados em uma comissão de concertação.

“Vou esgotar todas as instâncias possíveis, empregarei tudo o que estiver ao meu alcance para conseguir com que os opositores não fujam de seu trabalho e estejam aqui, ainda que na base de gritos e insultos, para defender seu ponto de vista”, sustentou a segunda autoridade boliviana, enquanto se via obrigado a declarar uma nova interrupção nos trabalhos. Os adjetivos que Linera recebeu na véspera não foram poucos: “maricón”, “terrorista fracassado” – em referência ao seu passado guerrilheiro – foram algumas das expressões usadas por parlamentares de direita na maratona de 24 horas que marcou a sessão que terminou com a saída da oposição logo após a aprovação dos termos gerais da lei. Essa norma é necessária para cumprir com o mandato da nova Constituição que definiu a realização de eleições presidenciais e parlamentares no dia 6 de dezembro deste ano.

A principal reivindicação da direita é refazer desde zero todo o padrão eleitoral, o que é considerado por Evo Morales como uma tentativa de sabotar as eleições. Nesta disputa – a quarta desde sua chegada ao poder em 2006 – o presidente boliviano buscará sua reeleição, prevista na nova Constituição por uma única vez. Em que pese a imagem exótica de ver um presidente em um pequeno colchão com uma dieta de água e balas, Evo Morales, de 49 anos, está mais do que curtido nestas questões. “Seguramente, pensaram em me vencer pelo cansaço”, ironizou Morales, ao mesmo tempo em que recordava que já esteve em outras greves de fome desde que ingressou na luta sindical campesina, em 1985, como a que realizou em 2002, logo depois de sua expulsão do Congresso, quando ficou mais de 18 dias em jejum.

Fontes do governo e da oposição concordam que, tecnicamente, há acordo e que falta apenas a decisão política de aprovar a norma. “A lei vai ser aprovada, mas é melhor que seja no marco de um consenso amplo”, assinalou o senador moderado de oposição, Carlos Börth, que calculou em um mil o número de pessoas que aderiram à greve de fome no país. A oposição teme especialmente o voto dos bolivianos no exterior, sobretudo o dos residentes na Argentina, em sua maioria de origem campesina. E não confia na transparência da contagem de votos nas embaixadas. A isto soma-se uma discussão acerca do número de circunscrições especiais indígenas, que buscam garantir a representação das etnias minoritárias. A oposição diz que o apoio de quase 100% à nova Constituição, registrado em algumas comunidades rurais, seria uma prova de fraude.

Para o governo, a “unanimidade” é uma simples constatação das práticas indígenas: decide-se em assembléia em quem votar e depois se vai às urnas para cumprir o que foi decidido. E o crescimento do padrão eleitoral é resultado da inclusão cidadã mediante o fornecimento de documento de identidade aos camponeses. Em meio à carência de líderes nacionais de oposição, nos últimos meses cresceu a figura do ex-vice-presidente aymara Victor Hugo Cárdenas, que teve sua casa “expropriada” por indígenas há poucos dias, por ter chamado voto “não” à Constituição. Mas seu passado como vice de Gonzalo Sánchez de Lozada – que fugiu do país, foi morar nos Estados Unidos e é processado pela repressão na guerra do gás de 2003 – parece uma hipoteca difícil de resgatar na hora de competir com Evo Morales pela presidência da República.

*Tradução: Katarina Peixoto*

domingo, 5 de abril de 2009

A política estadunidense de combate às imigrações


Ouça! (5’37’’ / 1,28 Mb) - Os Estados Unidos (EUA) anunciaram, recentemente, que pretendem usar veneno para combater a entrada de imigrantes vindos do México no país. Segundo as autoridades estadunidenses, o plano é usar um herbicida de nome Imazapyr para impedir que a vegetação fronteiriça cresça. Isso tornaria mais fácil a identificação dos imigrantes ilegais que tentam ultrapassar a fronteira.

A medida ainda não foi adotada porque autoridades mexicanas manifestaram preocupação com a contaminação dos rios que abastecem a população local.

Em entrevista à Radioagência NP, o engenheiro agrônomo do Núcleo de Economia Alternativa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Sebastião Pinheiro, fala sobre a política estadunidense de combate aos imigrantes ilegais e os diversos problemas que o Imazapyr pode a saúde humana.

Radioagência NP: Sebastião, o Imazapyr pode ser considerado um agrotóxico?

Sebastião Pinheiro: É um agrotóxico, é um herbicida de uso civil ou militar. Nesse caso terá um uso militar, isso porque será utilizado na fronteira sem a permissão do outro país visinho. A Colômbia responde um processo na Organização dos Estados Americanos (OEA), onde é acusada, pelo Equador, de utilizar o mesmo herbicida sobre a fronteira. Ali não é para impedir o avanço de populações humanas, mas para impedir o cultivo de narcóticos na Colômbia. O problema é mantido em sigilo. Agora você vê essa situação similar de uso deste herbicida, Imazapyr, na fronteira para fazer com que as pessoas fiquem mais visíveis e possam ser identificadas pelos satélites e sensores, e assim barateando o custo da caçada.

RNP: E quais as conseqüências que isso pode trazer?

SP: Toda a aplicação que é feita em um espaço vai trazer uma deriva. Esse é o termo utilizado para quando você aplica um veneno sobre um alvo que se move. Esse veneno pelo vento ou insolação, invade outro território, seja americano ou mexicano. E o que me deixa mais estupefado é que a notícia é plantada para ser tratada como se isso fosse normal. Nós deveríamos nos perguntar quem foi o doente que pensou uma coisa dessas.

RNP: Se isso ocorrer, o que pode acontecer com o rio que corta a fronteira dos dois paises e com as demais fontes de água na região?

SP: Quando se aplica um veneno é provocado um impacto sanitário-ambiental sobre esta massa de água. Esta massa de água, que no caso é o rio Bravo [lado EUA] – Rio Grande [lado México] - vai se contaminar. Todo herbicida é uma molécula química que inibe o metabolismo de seres vivos. Obviamente serão os vegetais os mais impactados. Agora, quem depura, fazem fotossíntese e purificam a água de um rio são as algas. Com esse herbicida na água, você inibe a purificação. Ou seja, a água vai apodrecer. Quem toma essa água? As populações ribeirinhas e cidades abastecidas pelo rio. Isso é extremamente perigoso, e é por isso que antigamente falavam no FDA – Food and Drug Administration [Departamento de Administração de Comida e Drogas – responsável pela análise da liberação de alimentos e drogas que iam ser usados na agricultura ou para consumo humano]. Hoje você não ouve falar mais nisso. Do governo [Ronald] Reagan [década de 80], para frente, esse departamento passou a ser dominado pelas indústrias, assim como hoje no Brasil, que o Ministério do Meio Ambiente foi dominado pelas indústrias.

RNP: Você falou que conhece um pouco sobre como funciona o transporte de pessoas através desta fronteira. Fale um pouco sobre isso.

SP: Esse mundo de transporte de pessoas através das fronteiras é um negócio bilionário. Cada pessoa que quer entrar nos EUA [de forma ilegal] paga até US$20 mil para um traficante de pessoas. Os americanos estão preocupados porque eles gastam uma fortuna [no combate à prática] e contratam mexicanos nativos que têm como função impedir a entrada pela fronteira. Não há coisa pior do que cair nas mãos da Migra [Instituto de Migrações]. As quadrilhas de mercenários da Migra são treinadas para serem genocidas. Há relatos de estupros de crianças e mulheres, além do assassinato de pessoas. Tudo agora tem um novo aliado chamado Imazapyr. O problema é à entrada de imigrantes analfabetos, porque os que têm mestrado ou doutorado são simplesmente capturados no México ou em outros lugares e levados para lá, para trabalhar quase como escravos.

De São Paulo, da Radioagência NP, Juliano Domingues.

27/03/09

Heloísa e Protógenes juntos em ato do PSOL contra o desemprego e a corrupção

A Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro, foi o palco de um grande ato realizado pelo PSOL na quinta-feira, 2 de abril. O ato, que reuniu cerca de 2 mil pessoas, foi convocado para apresentar publicamente as posições do PSOL para combater a crise econômica, de forma que os trabalhadores e o povo não paguem pela crise, e também para avançar na luta contra a corrupção e as oligarquias que governam nosso país desde sempre. Foram apresentadas propostas do partido contra o desemprego ─ por exemplo, o congelamento das demissões e a estatização das empresas que recebem dinheiro público e demitem ─ e contra a corrupção, como o fim do financiamento privado das campanhas eleitorais, a revogabilidade dos mandatos e o fim do sigilo fiscal e bancário dos políticos e agentes públicos.

A presidente nacional do PSOL, ex-senadora Heloisa Helena, foi uma das presenças mais esperadas no ato, além do delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz, um dos símbolos atuais da luta contra a corrupção, que foi aclamado como o “delegado do povo” . Também foi marcante a presença do ex-senador amapaense João Capiberibe, referência nacional e internacional na luta em defesa da Amazônia e da luta contra a oligarquia dos Sarney no Amapá. Estiveram presentes também os deputados federais do PSOL, Luciana Genro (RS), Ivan Valente (SP) e Chico Alencar (RJ) e vários vereadores do partido. A Conlutas, com um representante dos metalúrgicos de São José dos Campos, base onde se localiza a Embraer, que está em luta contra as 4,2 mil demissões, também falou no ato, assim como o companheiro Ciro Garcia, representando o PSTU. O deputado estadual do PDT/RJ, Paulo Ramos, também compareceu para homenagear o PSOL e comunicar que a Assembléia Legislativa do RJ vai conceder a Protógenes a medalha Tiradentes.

O ato do PSOL foi uma vitória da esquerda e das forças progressistas e populares, uma sinalização clara de que se constrói no país uma alternativa política pela esquerda. Foi um passo fundamental que deverá ser seguido por novas iniciativas políticas que busquem credenciar o PSOL como parte da reorganização da luta popular e pelo socialismo.

Estudantes em movimento em Montes Claros


Centenas de jovens saíram as ruas na cidade de Montes Claros, no estado de Minas Gerais, para exigirem dois direitos básicos: o direito de ir e vir e a gratuidade da educação, consagrados já na nossa constituição de 1988. O direito ao passe-livre ou a meia passagem como reinvindicam os estudantes existe apenas para valer os direitos das Leis Maiores de nossa Carta Magna.

Como é possível ter educação gratuita se os alunos precisam pagar pela passagem para ter educação? A gratuidade vai para o lixo na hora que passamos e pagamos na roleta! E educação não se dá só na sala de aula: se dá na biblioteca, no teatro, no campo de futebol, no Cinema, no lazer, no esporte, na casa de cultura etc. Por isto que o direito não se encaixa somente ao horário de aula ou alguns dias da semana, como querem alguns burocratas, mas a todo momento!

E quanto ao direito de ir e vir, em nosso país nunca sequer começamos fazer valer este direito! O Serviço de Transporte é um serviço público, tais quais são a educação e a saúde. E por mais problemáticos que sejam estes setores, minimamente temos um projeto de SUS e um Sistema Nacional de Educação Pública. Enquanto o transporte não. O transporte em nosso país seja municipal ou intermunicipal, seja rodoviário ou aéreo, está nas mãos de meia dúzia de sangue-sugas bilionários que sobrevivem do roubo aos bolsos dos trabalhadores e estudantes e colocam na sarjeta o nosso enfraquecido direto de ir e vir.

Parabens aos jovens de Montes Claros que não se deixam vencer e vão as ruas exigirem seus direitos!

Saiba mais!

Elcio Magalhães

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Os traidores de classe

Milton Temer

Kolontai, revolucionária combativa e dirigente competente, todos sabem, era uma mulher de dotes físicos admiráveis. Com o que, e principalmente pelo seu comportamento individual libertário, exercia forte influência sobre seus pares, em um momento em que os embates sobre os caminhos da Revolução eram disputados por uma direção de altíssimo nível, mas onde a maioria era conquistada em cada confronto específico.

Comenta-se que, para evitar problemas com sua camarada de lutas, por quem tinha respeito, mas de quem temia posições sectárias, Lenin preferiu afastá-la do núcleo de comando. Por conta disso, nomeou-a embaixadora na Suécia.

Pois bem, e aí vamos ao grão, em sua primeira entrevista coletiva, ela se vê acossada pela inconveniência de uma pergunta de um jornalista sueco: “Como se explica que eu, filho de um operário, me veja na condição de social-democrata, enquanto a senhora, filha de um general czarista, se transforma em líder bolchevique?”

Kolontai não hesitou, e desmontou o inquisidor com a resposta: “Isto se explica porque somos, ambos, traidores de classe”.

Essa historinha de tempos heróicos, difíceis de imaginar no tempo em que vivemos, me ocorreu por conta da brutalidade das últimas declarações de Luiz Inácio Lula da Silva, em uma de suas incontáveis aparições públicas, onde discursa para criar manchetes de jornal.

Não; não estou me referindo aos vilões de pele branca e olhos azuis. Quem tem que comentar tal deslize com mais propriedade é João Pedro Stédile, que bate na trave da descrição presidencial sobre os responsáveis pela crise gerada com a hegemonia do sistema financeiro privado sobre a economia globalizada. Ou o humanista Leandro Konder, com uma vida dedicada ao combate
intelectual sem tréguas ao capitalismo.

Estou me referindo ao absurdo do comício em que Lula conclamou os trabalhadores a, diante da complexa conjuntura atual, abrir mão do direito de reivindicar justa participação salarial na riqueza que produzem. "Hoje, mais do que fazer uma pauta de reivindicação pedindo mais aumento, temos que contribuir para que as empresas vendam mais" foi o que ele afirmou, sem
corar, na Feira de Construção Civil semana passada.

O que quer dizer tal barbaridade? É por ignorância ou por má-fé serviçal que alguém, invocando sua condição original de sindicalista, conclama os trabalhadores a se sacrificarem para que os patrões não se vejam prejudicados na manutenção da taxa de lucro obtida pela exploração da
mais-valia desses trabalhadores?

Tenho certeza de que não é por ignorância. E isto já havia sido demonstrado quando, por ocasião do encontro com o patronato da Embraer, Lula aceitou pacificamente os argumentos da empresa que terminara de demitir mais de 4000 trabalhadores. Argumentos que não impediram, logo depois, à Justiça do Trabalho, impor suspensão à medida, com imediata reintegração dos demitidos.

E não por acaso, assim agiu a Justiça. A Embraer não demitia porque não poderia pagar. Pelo contrário. Embora perdendo encomendas no exterior, seu fluxo de produção continuava normal. O que ela executava era em função de prever queda de faturamento futuro por conta do desdobramento da crise nos ditos países desenvolvidos. Ou seja; na possibilidade de diminuição dos lucros a partir de 2010, a Embraer se dava ao luxo de demitir, desde já, 4000 chefes de família, sem nenhuma proposta intermediária – férias coletivas, plano de demissão voluntária – a ser apresentada aos que tiveram as cabeças cortadas. O engulho é duplo quando nos recordamos que boa parte dos projetos exitosos da Embraer foi produto de sua fase estatal.

Lula, com seu discurso, deu provas, mais uma vez: um auto-proclamado representante do mundo do trabalho pode ser mais eficiente na defesa dos interesses do grande capital do que um magistrado, com origem acadêmica universitária, e previsivelmente muito mais identificado com este segmento privilegiado.

Com a extraordinária competência perversa do seu espírito pragmático, gera movimentos transformistas extremamente ambíguos, como os que executa em sua política externa, instalando confusão ideológica até entre seus adversários.

O exemplo mais recente está na participação na reunião dos ditos chefes de Estado “progressistas”, realizado em Viña Del Mar, numa preparação da reunião dos G-20. Ali, defendeu enfaticamente o Estado forte, regulamentador. Sem dúvida, Lula pratica um Estado atuante na economia, mas não no benefício dos mais necessitados de forma direta. Estado forte é o que põe em movimento com as isenções tributárias, subsídios e financiamentos a juros privilegiados que fornece ao grande capital. Quando obrigado a se posicionar na contrapartida social, a linguagem interna se modifica. Para além da “forma barata de tratar a pobreza”, com o Bolsa-Família, o Estado só faz se omitir nos conflitos sociais e trabalhistas.

Os banqueiros e os predadores do agronegócio, aliás, há muito tempo já haviam constatado isso.

Milton Temer
jornalista e presidente
da Fundação Lauro Campo

Aqui, agora, a casa grande e a senzala

Na última semana, no alvoroço do noticiário sobre as operações criminosas da Construtora Camargo Corrêa e da Daslu, mereceram registros na imprensa grande dois casos menores, mas sintomaticamente reveladores da cultura dominante nas elites e nas instituições que fazem e deveriam zelar pelas leis e pela promoção da igualdade e da Justiça no Brasil.

O primeiro caso é o da filha do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, a bióloga Luciana Cardoso, que, em entrevista para a Folha de S. Paulo, revelou ser funcionária do Senado Federal desde 2003 (antes disso estava empregada com o pai no Palácio do Planalto), com salário de R$7,6 mil por mês, lotada no gabinete do senador Heráclito Fortes, do DEM do Piauí.

Em princípio, nada errado, já que é direito dela trabalhar onde bem entender. Acontece que ela admitiu, na entrevista, que não frequentava o Senado porque achava o local uma “bagunça”, que “trabalha em casa” e se dedica a cuidar de “coisas particulares” do senador piauiense – sem saber especificar quais seriam essas coisas. Deixou claro que o tal emprego é mesmo uma boa sinecura, daquelas em que se é remunerado sem nenhuma contrapartida de prestação de serviços.

Como se trata de gasto público do Senado Federal, o Ministério Público – diante da exposição midiática do caso – foi obrigado a exigir junto ao Tribunal de Contas da União que a filha de FHC devolva os salários recebidos desde 2003, tendo em vista que ganhou sem trabalhar. O caso praticamente desapareceu da mídia e, com certeza, não vai acontecer nada a Luciana Cardoso, que poderá continuar no gabinete do senador Heráclito ou em outro nicho qualquer.

O segundo caso é o da empregada doméstica Izolda da Silva Lima, denunciada pela imprensa por prestar serviços particulares para o deputado Alberto Fraga, do DEM do Distrito Federal (licenciado e no cargo de secretário dos Transportes do DF) e receber salários de R$480,86 por mês, lotada como secretária parlamentar na Câmara dos Deputados, também desde 2003.

A diferença é que Izolda trabalha de verdade, presta serviços realmente privados na casa do deputado Fraga, às margens do Lago Paranoá, não é e nunca foi funcionária do Congresso Nacional. Não tem a menor culpa se o seu patrão incluiu o nome dela na folha de pagamento do serviço público e se pagou o seu minguado salário com o dinheiro do povo. A safadeza não é da Izolda, é do deputado e secretário.

Exatamente um dia depois de o caso vir a público, o deputado Osório Adriano, também do DEM-DF, suplente de Adriano Fraga, comunicou de público a exoneração de Izolda da Silva Lima do quadro de funcionários da Câmara dos Deputados. Não se sabe se a empregada doméstica continua ou não prestando serviços particulares ao atual secretário dos Transportes do Distrito Federal. Ou se também perdeu o emprego e o seu sustento.

Os dois casos, por mais singelos que sejam – no mar de desvios de recursos públicos e de sonegações que abunda a República –, são exemplos concretos do tratamento desigual que é cotidianamente dispensado para ricos e pobres, elites dominantes e trabalhadores em geral – nos mais diferentes ambientes do País. Os casos de Luciana e Izolda reproduzem, em 2009, a organização social e o patriarcalismo tão bem descritos em Casa Grande e Senzala, o livro imortal de Gilberto Freyre, publicado em 1933.

Até quando?

Hamilton Octavio de Souza

é jornalista e professor da PUC-SP.