segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Frente à crise capitalista e ambiental, afirmar a saída ecossocialista

Resoluçãodo 3º Congresso do PSOL

Militantes ecossocialistas, reunid@s em São Paulo , em 3 e 4 dedezembro de 2011, por ocasião do 3º Congresso do do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), reafirmaram e atualizaram a Carta de Curitiba, que estabeleceu o Setorial Ecossocialista do partido. E apresentam aqui sua reflexão sobre a atual crise, as políticas destrutivas aplicadas pelo governo brasileiro e as lutas necessárias para enfrentar a crise ambiental criada pelo capitalismo globalizado e estabelecer uma sociedade justa e sustentável, social e ambientalmente.

Estamos imersos em uma crise planetária, de proporções inéditas. Sua face mais visível, mas não única, é o aquecimento global, decorrente das emissões de gases do efeito estufa, que gera enormes mudanças climáticas. Não há um só dia em que não se observe a ocorrência de fenômenos climáticos extremos, gerando dezenas de milhões de refugiados ambientais no planeta. As Conferências do Clima no âmbito das Nações Unidas sucedem-se sem nenhum acordo para reduzir as emissões de carbono. Enquanto estamos reunidos nesse Congresso, o 17ª encontro da Conferência do Clima esta instalado em Durban, na África do Sul, sem perspectivas de apresentar soluções concretas para a maior ameaça ambiental da história humana. Ao contrário, premido por uma grave crise estrutural, manifesta depois de 2008 e agravada em 2011, o capitalismo descarrega os custos de seu enfrentamento sobre populações trabalhadoras e ecossistemas.

Esta é, assim, apenas a face mais visível de uma crise maior, decorrente da atual configuração do modo de produção capitalista, com seu modelo de desenvolvimento produtivista-consumista, baseado na matriz energética fóssil eu m modo de vida das elites econômicas baseado no consumo ostensivo e perdulário, na descartabilidade e na obsolescência planejadas, que são, a um só tempo e em todas as escalas, ambientalmente insustentáveis e socialmente injustos.

Outros sinais dessa crise são a escassez da água, onde uma em cada quatro pessoas no mundo de hoje não tem acesso a água potável; a redução da biodiversidade pela extinção das espécies, que é a mais elevada em 65 milhões de anos, já configurando uma sexta onda de extinção em massa na história da Terra; e a ruptura de vários ciclos vitais da biosfera planetária, que faz com que anualmente o impacto da atividade humana ultrapasse em 30% a capacidade de regeneração do conjunto dos ecossistema. Catástrofes ambientais ocorrem cotidianamente, dos deslizamentos na região serrana do Rio de Janeiro ao acidente nuclear de Fukushima, do “acidente” na plataforma da British Petroleum no Golfo do México ao “acidente” da Chevron na Bacia de Campos.

Em nosso país – cuja formação histórica, socioeconômica e cultural foi fundada na monocultura de exportação, na escravidão, na sistemática superexploração e genocídio dos povos indígenas e afrodescendentes e na rapina e devastação de nossa natureza – o Programa de Aceleração do Crescimento dos governos Lula e Dilma é a última faceta do“desenvolvimentismo”. E é este desenvolvimentismo, com seus mega-emprendimentos predatórios, que alavanca hoje o capitalismo brasileiro.

Assim, os compromissos do governo com o agronegócio cobram seu preço na reforma regressiva do Código Florestal, que ampliará o desmatamento e a emissão de carbono. Apesar da objeção de boa parte da sociedade brasileira, avança a construção da usina de Belo Monte, penalizando populações tradicionais e ameaçando a sobrevivência dos povos indígenas da região. Como avançam as obras da Transposição do São Francisco, desviando a água do rio para os empreendimentos capitalistas da região. Hidrelétricas e obras como Santo Antonio, Jirau, TKCSA,CSU, Porto Sul, Pólo Naval, com seu repertório de agressões socioculturais, étnicas e ambientais; a manutenção da política de genocídio do povo Kayowá-Guarani pelo agronegócio em Mato Grosso do Sul; a degradação dos ecossistemas e dos cursos d’água pelo uso dos agrotóxicos; a manutenção do programa nuclear; a expansão da opção pelo transporte privado nas grandes cidades; a atuação predatória frente às jazidas do pré-sal; o ataque à legislação ambiental, configurada não só no Código Florestal mas também na flexibilização do licenciamento ambiental e no abandono de mecanismos de controle social sobre as politicas ambientais – além da agenda excludente das obras da Copa do Mundo e Olimpíadas –, tudo isso demonstra até onde o capital quer chegarem nosso país.

Vivemos, aqui como no resto do mundo, uma crise que é econômica, social, ambiental e civilizacional, uma crise que impõe uma disputa de natureza ideológica sobre o entendimento das suas causas e métodos de enfrentamento, que confronta, em matizes diferenciados, capitalistas “verdes” versus “ecossocialistas”. Estamos frente a uma disputa sobre projetos de sociedade e, portanto, de civilização.

A compreensão dos que se reivindicam herdeiros das utopias igualitárias, às quais se agrega em nossa época o ecologismo, é a de que, nas precisas palavras do Manifesto Ecossocialista Internacional, “o atual sistema capitalista não pode regular, muito menos superar, as crises que deflagrou. Ele não pode resolver a crise ecológica porque fazê-lo implica em colocar limites ao processo de acumulação – uma opção inaceitável para um sistema baseado na regra ‘cresça ou morra’”. Trata-se, assim, não só de uma crise ambiental e social, mas uma crise da própria civilização do capital, de sua lógica econômica, de seu modelo de desenvolvimento, de seu modo de vida e dos seus valores.

Denunciamos e combatemos as relações espúrias e corruptas dos agentes públicos com os grandes grupos financeiros, industriais, empreiteiros e do agronegócioque financiam suas campanhas eleitorais para depois cobrar o preço amargo da destruição e da inviabilização de todas as formas de vida.

Denunciamos os discursos e as práticas supostamente voltadas para a preservação de ecossistemas, mas cuja retórica esconde nefastos interesses pela exploração acelerada dos recursos naturais e a conseqüente desagregação dos diversos biomas e modos de vida humana a eles associados.

Denunciamos aqueles originários da esquerda que, entre a garantia dos direitos das classes trabalhadoras e a aliança com a burguesia internacional, optaram por esta última e se transformaram nos fiadores da desgraça e da destruição ambiental. A opção pelo crescimento econômico indiscriminado está diretamente ligada à adaptação da economia brasileira ao capitalismo global, que exige a reorientação de boa parte da economia para a exportação. A exportação de commodities é também exportação de água, energia e vida do nosso povo e dos nossos ecossistemas.

Só um partido que se reivindique da tradição anti-capitalista, mas que tenha rompido com as experiências autoritárias, burocráticas e predatórias do chamado “socialismo real” – um partido que dialogue e interaja com as comunidades tradicionais e os movimentos sociais, ecológicos e socioambientais– pode enfrentar esse processo de degradação e estabelecer as alianças táticas e estratégicas para a luta ecossocialista.

Assim, o PSOL e o conjunto dos seus militantes assumem os seguintes compromissos:

• Denúncia e combate permanente à tentativa de flexibilização da Política Ambiental, notadamente a revisão do Código Florestal, reforçando os atos já convocado pelos movimentos sociais para 10 de dezembro de 2011;

• Denúncia e combate permanente à construção da Usina de Belo Monte, reforçando os atos já convocados para 17 de dezembro de 2011;

• Luta pela redução drástica da emissão de gases do efeito estufa em escala mundial, a fim de retorna-los ao nível seguro de 350 partes por milhão de concentração de dióxido de carbono (CO2) e seus equivalentes. Defesa, no Brasil, do aprofundamento do Plano Nacional de Mudanças Climáticas, estabelecendo metas de redução de 50% das emissões brasileiras em 10 anos.

• Acompanhamento, denúncia e resistência às arbitrariedades e desvios dos projetos, das obras e impactos do PAC, inclusive na preparação para os mega eventos da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016, principalmente no que tange à degradação das condições de trabalho, os despejos e remoções forçadasde comunidades pobres, o estímulo à prostituição e tráfico de mulheres ecrianças, bem como à redução da biodiversidade;

• As comunidades atendidas e atingidas pelos grandes empreendimentos, obras de infra-estrutura, planos diretores urbanos, unidades de conservação, projetos de geração de energia (inclusive renovável) e projetos agroindustriais devem ter garantida sua participação qualificada, continuada e legitimada emtodas as suas fases, desde os diagnósticos até as medidas para tratamento dos impactos.

• Diversificação da matriz energética brasileira, bloqueando a instalaçãode usinas térmicas movidas a combustíveis fósseis, denunciando seus impactosnas escalas local a global e defendendo formas alternativas e renováveis degeração de energia, com o mínimo impacto ambiental e sob controle social (“energia certa, do jeito certo”). Apoio às políticas de eficácia energética e rediscussão da utilização da energia gerada, suas tarifas, concessões e prioridades (“energia para que e para quem?”).

•Ampla mobilização para enfrentar a questão nuclear e barrar o programa nuclear brasileiro através do parlamento e dos movimentos sociais! Pelo descomissionamento de Angra 1, 2 e 3! Pelo cancelamento de novos projetos de usinas nucleares e do uso militar de artefatos e reatores!

•Ampliação das áreas protegidas por unidades de conservação nos diversos ecossistemas brasileiros, com garantia da participação pública qualificada na gestão e integração aos modos de vida das comunidades locais.

• Por uma reforma agrária ecológica. Contra os Desertos Verdes e as monoculturas. Apoio à campanha de denúncia do uso dos agrotóxicos e dos organismos geneticamente modificados. Pelo fim imediato da isenção de impostos para substâncias agrotóxicas. Defesa da agroecologia familiar como alternativa para a produção de alimentos. Implantação do desmatamento negativo via recuperação de áreas desmatadas, com reflorestamento que respeite a biodiversidade original.

• Por uma reforma urbana inclusiva e ambientalmente responsável, com o fim da especulação imobiliária e da privatização dos espaços públicos. Adoção de um programa de cidades verdes, com geração local de energia, eficiência energética e arquitetônica, ampliação da cobertura vegetal, destinação para o uso cidadão dos espaços públicos, etc, via mecanismos de incentivo e proibições.

•Adoção de uma política de transporte e mobilidade que privilegie o transporte público e penalize o individual, incidindo especialmente sobre o mercado de carros de luxo e de alta cilindrada. Apoio irrestrito a movimentos contra a carestia dos transportes públicos (movimentos pelo passe livre e pela tarifa zero), além da luta por uma gestão mais transparente dos sistemas de transporte urbano, grande expansão das ciclovias, a integração entre os diversos modais e o fim da dependência do rodoviarismo.

• Ainda no âmbito das cidades, a destinação dos resíduos sólidos constituem um desafio inadiável. É preciso atacar os aspectos degradantes do sistema produtivo, tais como a irresponsabilidade das empresas com as embalagens de seus produtos e reciclagem de seus produtos. Por uma politica publica de reciclagem, de valorização e proteção aos profissionais da limpeza urbana e apoio e estimulo a formacao de associacoes de catadores de materiais reciclavel.

•As zonas costeiras devem ser geridas como bem público inalienável e como santuário da vida. Portanto, repudiamos toda e qualquer atividade que cause constrangimentos à pesca e à navegação artesanal; ao uso público das praias e demais bens naturais litorâneos; ou a ameaças aos patrimônios genéticos marinhos e estuarinos.

• Pelo reconhecimento e demarcação de territórios quilombolas, terras indígenas e reservas extrativistas! Contra o Racismo Ambiental!

•Vinte anos depois da Eco92 e após dez anos de governos desenvolvimentistas do PT, utilizaremos o momento da Rio+20, de 13 a 20 de junho de 2012, como uma oportunidade para questionarmos de forma sistemática os descaminhos sócio-ambientais do Brasil e do mundo e apresentarmos nossas alternativas. Dessa forma, impulsionaremos ativamente o evento paralelo ao oficial, a “Cúpula dos Povos da Rio+20 por Justiça Social e Ambiental”, reforçando seu caráter de crítica do sistema capitalista e do modelo sócio-econômico vigente no Brasil.

•E participaremos ativamente do Fórum Social Temático “Crise capitalista, justiça social e ambiental”, programado para Porto Alegre, de 24 a 29 de janeiro de 2012. Estimularemos nossa militância nos movimentos sociais a dialogarem com os grupos temáticos formados para este Fórum e organizaremos, pela Fundação Lauro Campos, uma agenda de debate e intervenção nas lutas sócio-ambientais que nele se articularão, inclusive no caminho da Cúpula dos Povos da Rio+20.

Oque se coloca para a humanidade é o desafio da constituição dessa nova sociedade que possa vir a ser, a um só tempo, politicamente democrática, socialmente justa e igualitária, cultural e etnicamente diversa e ambientalmente sustentável. Assim, na esteira de Michael Löwy, pode-se atualizar a consigna de Rosa Luxemburgo para “Ecossocialismo ou Barbárie”!

Ivan Valente é eleito novo presidente nacional do PSOL



Escolha marcou o encerramento do 3o Congresso do Partido Socialismo e Liberdade, que aconteceu em São Paulo neste final de semana.

Os mais de 330 delegados do 3o Congresso Nacional do PSOL, reunidos em São Paulo neste final de semana, escolheram como novo presidente do Partido Socialismo e Liberdade o atual deputado federal Ivan Valente. Quatro chapas participaram da disputa. A chapa encabeçada por Ivan Valente foi a vencedora, com 42% dos votos.

O resultado da eleição para a nova direção nacional do PSOL é uma sinalização de que o partido deve se voltar para fora e de que o programa, que já vem diferenciando o PSOL nas grandes questões nacionais, conta com amplo apoio de seus filiados.

Para Ivan Valente, a escolha da nova direção acontece num momento importante, de preparação para a participação do PSOL nas eleições municipais de 2012. "O PSOL já disputa cidades importantes no país, com boas possibilidades eleitorais em capitais como Rio de Janeiro, Belém e Macapá. Vamos entrar no processo eleitoral para acumular forças e chegar inclusive a vitórias", afirmou.

O 3o Congresso Nacional do partido aprovou resolução defendendo a construção da Frente de Esquerda no processo eleitoral de 2012, em aliança com PSTU e PCB. Para além da Frente - já concretizada em disputas anteriores - outras alianças serão definidas caso a caso pelo Diretório Nacional do PSOL.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Florestas fora da Lei

O projeto de lei do código florestal, ora em tramitação no Senado, reduz drasticamente a proteção das áreas úmidas em geral e das florestas inundáveis em particular. Cerca de 20% do território brasileiro é coberto por áreas úmidas.

Florestas inundáveis representam uma grande parte das florestas do país. Estudos científicos recentes indicam que só nas várzeas e igapós da Amazônia elas ocupam áreas de cerca 400 000 km2.

Devido ao particular regime de chuvas e características de relevo de nosso país, os desníveis entre a época de cheia e de vazante da maioria dos igarapés e rios brasileiros é de vários metros, atingindo mais de dez na Amazônia. As áreas inundáveis ao longo dos rios, recobertas por florestas ou outros tipos de vegetação, chegam, em muitos casos, a cobrir centenas de quilômetros quadrados.

Estas áreas são protegidas pela legislação atual que as considera propriedade da União (Constituição Art 20 ) enquanto pertencem ao leito dos rios, entendidos ( há mais de cem anos ) como a calha compreendida entre as margens altas

Estas são definidas como a linha média das margens das vinte maiores cheias registradas (subtraidas as extremas).

Utiliza-se a cheia como referência básica uma vez que, tomando outra linha de referência - mais baixa - teríamos um leito do rio de margens variáveis ao longo do ano, o que atribuiria ao patrimônio da União um caráter flutuante!

O novo projeto de Código Florestal (PLC 30) redefine (Artigo 3º inc. IV) o leito do rio como sendo "a calha por onde correm regularmente as águas durante o ano".

Sendo que no Art 4 considera as Áreas de Proteção Permanente: "as faixas marginais de qualquer curso d'água natural, desde a borda da calha do leito regular"... definindo depois as suas larguras mínimas de acordo com esse leito. O que significa regular em uma hidrografia muito irregular como a nossa?

Se esta definição de leito do rio prevalecer não apenas o patrimônio da União ficará subtraido de centenas de milhares de km2 como também as Áreas de Proteção Permanente recuarão drasticamente. Ao imbroglio Constitucional deverão se acrescentar os danos ambientais decorrentes desta equivocada caracterização dos nossos rios e da consequente redução das áreas inundáveis atualmente protegidas.

As águas que na Amazônia podem alagar por 270 dias por ano extensas áreas de floresta, recuam na vazante para apenas 20% da área ocupada na cheia. Nestas épocas estocam grande quantidade de água que, na estiagem, contribui com mais de 30% da vazão dos principais rios.

Além de estocarem água, as áreas alagáveis atuam na sua limpeza, recarregam o lençol freático, regulam os ciclos biogeoquímicos e o clima local. O mesmo acontece com as savanas alagáveis no cerrado como, por exemplo, aquelas do Pantanal, as savanas dos rios Araguaia e Guaporé, e as savanas alagáveis de Roraima. Danos causados às florestas alagáveis e seus ambientes reduziriam dramaticamente a capacidade de estoque das águas com consequências gravíssimas para a vazão dos rios.

As florestas alagáveis são únicas no planeta uma vez que sua vegetação está adaptada às condições de inundação (períodos estes em que há uma pausa em sua capacidade de absorver carbono!) e abrigam uma singular variedade de espécies vegetais, estimada, só na Amazônia, em cerca de mil e quinhentas espécies. Por outro lado a vegetação destas florestas é também responsável pela manutenção e expansão da biodiversidade vegetal e animal, incluindo muitas espécies endêmicas. Estudos recentes sublinharam a grande importância dessas formações nos balanços de carbono regionais.

Deve-se por fim observar que as áreas alagáveis são habitadas, por vezes intensamente, por comunidades que vivem em palafitas ou em flutuantes e que obtêm seu sustento por meio de atividades econômicas adaptadas às áreas periodicamente alagadas. Estima-se que cerca de 60% da população rural da Amazônia está concentrada nas várzeas, áreas alagáveis de maior fertilidade. Estas populações desenvolvem atividades de agricultura familiar com propósitos econômicos e de subsistência: pesca, criação de animais e extração de produtos madeireiros e não madeireiros. Populações tradicionais e indígenas vivem também há centenas de anos no Pantanal do Mato Grosso, extraindo seu sustento de atividades similares.

As comunidades que habitam as áreas alagáveis vivem em terras da União, muitas vezes concedidas a eles em comodato pelo Governo. A elas deveria ser garantido o direito de uso desses ambientes, assegurando também sua integridade ecológica e múltiplas funções. Somente dessa forma essas populações poderão continuar a exercer seu direito de plantar, pescar e colher para fins não apenas de sustentação mas também de geração de renda. A modificação proposta na nova versão do código Florestal em tramitação colocará em risco esse direito, como também contribuirá para a degradação desses ambientes únicos do Brasil.

Cabe por fim mencionar que o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o IPCC, prevê entre outras mudanças climáticas, mais chuvas nas épocas chuvosas e épocas secas mais pronunciadas para grandes partes do território nacional. Áreas úmidas bem conservadas atuam como esponjas na paisagem. Elas estocam a água na época chuvosa e a liberam na época seca.

Esta função é indispensável para reduzir os impactos negativos das mudanças climáticas tanto para a agricultura e o meio ambiente como para o abastecimento da população com água potável. Por isso, a proteção das áreas úmidas não é só uma questão ecológica, mas também uma questão nacional relevante para a economia e a sociedade. Trata-se de 20% do nosso território! Mais de um milhão de quilômetros quadrados, hoje, ainda, de propriedade da União.

Ennio Candotti é físico e diretor geral do Museu da Amazonia (Musa)

Maria Teresa Fernandez Piedade é membro do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazonia

Wolfgang Junk é membro do Instituto Nacional de Ciencia e Tecnologia em Áreas Umidas (INCT-INAU)

Fonte: Caros Amigos