quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Marcha do MST tem início: Companheira Cícera, presente!

Raul Marcelo

Teve início nesta quinta-feira pela manhã (6) a Marcha Estadual pela Reforma Agrária, promovida pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Por volta das 7 horas da manhã, cerca de 1.500 trabalhadores e trabalhadoras iniciaram a caminhada de 100 km para chegar de Campinas a São Paulo (pela rodovia Anhanguera).

O deputado Raul Marcelo esteve presente ao ato realizado no Largo do Rosário, em Campinas, para lançar a Marcha, na noite deste dia 5. O parlamentar parabenizou o movimento. “Aqui estão as pessoas efetivamente comprometidas com o futuro do nosso país”, disse. E lembrou o assassinato de militantes do MST em Eldorado dos Carajás (PA) como um símbolo da resistência dos trabalhadores rurais contra o capital nos últimos 25 anos.

Durante o ato, Paulo Oliveira, dirigente estadual do MST, ressaltou que a caminhada é “parte de todo um processo de organização e reorganização da classe trabalhadora, rumo à construção de uma sociedade socialista. É mais uma das atividades de um conjunto de lutas que vão ser deflagradas em todo o Brasil a partir do dia 10 ao 14 de agosto. E tem o objetivo de ir até São Paulo dialogando com trabalhadores e trabalhadoras sobre a necessidade de construir um processo de lutas permanente, na busca de construir um movimento maior com o conjunto da classe trabalhadora para de fato impor uma derrota a esse modelo de produção.”

Uma fatalidade
Quando a Marcha chegava à cidade de Vinhedo na manhã deste dia 6, próximo à localidade conhecida como Parque da Uva, a militante Maria Cícera Alves foi atropelada por um caminhão. A militante do assentamento Zumbi dos Palmares, em Iaras, morreu em decorrência do atropelamento. O mandato presta aqui uma singela homenagem a Maria Cícera por sua dedicação à luta em defesa da reforma agrária. Maria Cícera, presente!

Nesta quarta-feira (12 de agosto) quando será realizado o Ato Solene em homenagem aos 25 anos do MST, mais uma vez prestaremos uma homenagem também a Maria Cícera. O ato é promovido pela Frente Parlamentar pela Reforma Agrária e acontecerá no auditório Franco Montoro da Assembleia Legislativa, a partir das 19 horas.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Como diria Lula: Sarnei tem História!

O outono do patriarca

Marco Antonio Villa, Folha de S. Paulo, 27/07/09

TENDÊNCIAS/DEBATES


O presidente Lula tem razão: Sarney não é igual à maioria dos brasileiros. Ainda bem. Quem é Sarney? Ele é o símbolo maior do atraso

NA PRESIDÊNCIA do Senado, José Sarney conseguiu o impossível: ser pior do que alguns dos seus antecessores, como Antonio Carlos Magalhães, Jader Barbalho e Renan Calheiros, que acabaram defenestrados. Todos negaram as acusações que pesavam sobre eles. Pareciam inabaláveis, tal qual Sarney.
Porém, o velho coronel do Maranhão está conseguindo se manter no cargo por mais tempo do que seus velhos amigos. Afinal, como disse o presidente Lula, ele não é igual a nós, ele tem uma história. Lula tem razão: Sarney não é igual à maioria dos brasileiros. Ainda bem. Quem é Sarney? José Ribamar Ferreira de Araújo Costa nasceu em 1930, ano da revolução que mudou o Brasil. Paradoxalmente, ele é o símbolo maior do atraso, do passado que nunca passa, da antirrevolução.
Fez a pequena política local até chegar, em 1958, ao Rio de Janeiro, como deputado federal, ainda jovem, eleito pela UDN. Participou pouco dos debates, nunca foi um bom orador. A voz soava mal, as ideias eram ultrapassadas e sem nenhuma novidade, o raciocínio era lento e era pobre sua linguagem gestual. Não tinha nada que o destacasse.
Na grave conjuntura de 1963-1964, raramente apareceu nos debates. Omitiu-se. Preferiu as sombras, aguardando hora mais tranquila. Candidatou-se ao governo do Maranhão em 1965 e venceu com o apoio dos novos donos do poder, os militares. Depois foi para o Senado -e lá ficou por quase 15 anos.
Se consultarmos os anais daquela Casa, raramente veremos Sarney participando de um debate. A sua preocupação central não eram os grandes problemas nacionais, nada disso. Seu pensamento e sua ação política estavam na província. Controlava as nomeações e os recursos orçamentários. Dessa forma, conservou sua força política local graças à influência que mantinha na capital federal.
Mas o coronel era hábil. Não queria ser um novo Vitorino Freire, o mandão que o antecedeu. Buscou dar um verniz intelectual ao poder discricionário que exercia na província. Isso pode explicar a publicação de romances e contos, a entrada para a Academia Brasileira de Letras e o estabelecimento de amplo círculo de relações sociais com intelectuais e jornalistas.
No Sul do país mostrava seu lado cosmopolita, falando de poesia e filosofia. Na província voltava ao natural, não precisava de nenhum figurino: era o senhor do baraço e do cutelo. Que digam os oposicionistas -e foram tantos- que sofreram a violência do mandão local. Lá, durante mais de 40 anos de poder, o interesse público nunca esteve separado do interesse da família Sarney e de sua parentela.
Por um acaso da história, acabou presidente da República. Durante os comícios da Aliança Democrática, em 1984, ficava escondido no palanque. Quando era anunciada a sua presença, era vaiado impiedosamente. Afinal, servira fielmente o regime militar por 20 anos.
A sua Presidência foi um desastre completo. Três planos de estabilização econômica. E todos fracassaram. Terminou o governo com a inflação próxima de uma taxa de 100% ao mês. Omitiu-se quanto aos principais problemas. No ocaso do governo foi instalada no Congresso Nacional uma CPI para apurar casos de corrupção, com graves acusações à gestão presidencial e a sua família, em especial seu genro, Jorge Murad.
O desprestígio era tão acentuado que nenhum candidato às eleições presidenciais de 1989 -e eram mais de uma dúzia- buscou seu apoio. Mas o oligarca sobreviveu. Buscou um mandato de senador no recém-criado Amapá. Precisava como nunca da imunidade parlamentar.
O tempo passou e a memória nacional foi se apagando, como sempre. O oligarca, em uma curiosa metamorfose, transformou-se em estadista. Encontraram até qualidades no seu período presidencial. Não tinha sido um indeciso. Não, nada disso. Fora um conciliador, avalista da transição para a democracia.
No governo Lula, mandou mais do que na sua Presidência. Conseguiu até depor o governador Jackson Lago, que teve a ousadia de vencer nas urnas a sua filha. A sua cunhada, presidente do TRE, anulou a eleição e, pior, obteve a chancela do TSE.
Contudo, não há farsa que perdure na história. O que foi revelado pela mídia nacional não é nenhuma novidade para os maranhenses. Lá, o rei está nu há muito tempo.
No encerramento do semestre legislativo, Sarney discursou para um plenário vazio. Não houve palmas ou apupos. Desceu e caminhou pelo corredor, silenciosamente. Nas galerias não havia um simples espectador. O velho oligarca estava só. Parou e, como se dissesse adeus, dirigiu-se para seu gabinete: a tragicomédia está chegando ao fim.

MARCO ANTONIO VILLA, 54, é professor de história da UFScar (Universidade Federal de São Carlos) e autor, entre outros livros, de “Jango, um Perfil”.