No último dia 10 de agosto aconteceu na Bolívia o Referendo Revogatório dos mandatos do Presidente Evo Morales, do Vice-Presidente Álvaro Linera e dos governadores dos nove departamentos daquele país. A delegação do PSOL esteve representada por três observadores internacionais, pelo Senador José Nery a convite da Corte Nacional Eleitoral, por Juliano Medeiros, militante do PSOL no Rio Grande do Sul e também diretor da UNE e por mim, Nathalie Drumond, militante do PSOL em São Paulo e também diretora do DCE da USP. Além de nossa delegação, também estavam presentes representantes de Estado e de organizações sociais de diversos países como os companheiros peruanos do La Lucha Continua, os companheiros venezuelanos da Frente Popular e da Frente Campesina. Nós do PSOL acompanhamos desde quinta-feira os preparativos para o referendo. Estivemos presentes junto ao grupo de observadores internacionais que acompanhou todo o processo e tivemos oportunidade de travar contato com companheiros militantes da Bolívia e de outras delegações. Contexto em que se deu o Referendo A proposta de referendo foi aprovada poucos dias depois de saírem os resultados da aprovação do Estatuto Autonômico em quatro províncias bolivianas, Santa Cruz, Pando, Beni e Tarija, que compõe o que se chama de “Meia Lua”. Os governadores da “meia lua” não hesitaram em deslegitimar o referendo alegando que cada província tinha soberania para aceitar ou não a sua realização. Neste contexto, a direita golpista embruteceu mais uma vez seu discurso de oposição a Evo. Poucos dias antes do referendo o clima era tenso, beirando a possibilidade de um conflito violento. Iniciaram-se neste período greves de fome em defesa do repasse dos benefícios do “Impuesto Directo a los Hidrocarburos” (IDH), piquetes que fecharam avenidas e estradas por longos dias e também ocorreu a tomada das pistas de alguns aeroportos impedindo que Evo chegasse às atividades da campanha do “Sim”. Sem uma ação nacionalmente mais unificada, mas com um enfrentamento forte em algumas províncias, a direita separatista utilizou da desculpa da autonomia para afirmar sua defesa de um projeto neoliberal em que pese as relações privilegiadas com empresas transnacionais, o retorno do seu domínio exclusivo sobre a venda dos recursos naturais da Bolívia, entre outras coisas, e que ela possa seguir governando para as minorias ricas. É importante também esclarecer que a oposição de direita a Evo não é um setor absolutamente coeso, mas tem ganhado força e expressão social na região da “meia lua”, especialmente em Santa Cruz, cujo prefeito Rubén Costas segue se fortalecendo na escalada contra Evo. A burguesia boliviana da “meia lua” mostrou sua capacidade de organização, o respaldo significativo que tem da população, principalmente dos setores da classe média, além do apoio do imperialismo norte-americano. Somado a resistência às políticas de Evo, a direita seguiu numa ofensiva quanto ao seu projeto de autonomia. Prometendo que assim que passasse o referendo, estas iniciariam em suas províncias a criação de um parlamento autônomo, a elaboração de leis próprias, a criação de suas próprias polícias militares, etc. Enquanto isso, o governo Evo Morales também enfrentava uma outra oposição, esta vinda da Central Obrera Boliviana. A COB há algumas semanas vinha liderando uma forte mobilização em defesa de uma proposta própria de “Lei de Pensões”. Porém, na semana antecedente ao referendo a central convocou uma greve geral e advertiu o governo que se caso suas reivindicações não fossem acatadas ela indicaria para o referendo um “voto de castigo”. Neste mesmo período, os mineiros da COB de Oruro organizaram um levante que foi reprimido pela polícia causando duas mortes e dezenas de feridos. Apesar do condenável ato de repressão, podemos tirar daí algumas conclusões. A política da COB de chamar uma greve geral dias antes do referendo e de indicar um voto de castigo a Evo significou somar coro com a oposição de direita. Porque num momento tão polarizado da política boliviana, onde de um lado está Evo com o apoio popular majoritariamente campesino-indígena e do outro a direita golpista, posicionar-se decididamente contra Evo não fortalecera à COB e às suas reivindicações, mas sim fortaleceu a direita golpista que vem querendo se postular, e tem conseguido, como principal saída para aqueles que estão descontentes com a política de Evo de defesa da soberania nacional e de democratização do Estado. E foi no campo da burguesia que a COB jogou neste momento. Os resultados do referendo: Evo sai ratificado, mas a “meia lua” também. No dia do referendo o clima geral na Bolívia foi de bastante tranqüilidade. Os resultados do referendo do dia 10 de agosto mostram o grande apoio popular que Evo Morales logra ainda na Bolívia. Do total de votos válidos, 67% eram a favor da permanência do presidente, 14% a mais do total obtido na sua eleição em 2005. Um grande ato em comemoração à sua vitória reuniu em torno de 10 mil pessoas em frente ao Palácio do Governo, minutos após a divulgação dos resultados. Porém, os resultados da consulta sobre os governadores também significam muito para entender melhor este processo. Apesar, de três prefeitos terem sido revogados - os prefeito de Cochabamba e de La Paz alinhados à oposição e o prefeito de Oruro do MAS – a maioria dos prefeitos da “meia lua” foram ratificados com ampla margem de aceitação. O governador de Santa Cruz, por exemplo, obteve 66% dos votos favoráveis. Assim como os seguidores de Evo, os apoiadores de Ruben Costas também se reuniram em Santa Cruz para comemorar a sua vitória. Neste ato, Costas afirmou que os resultados do referendo só acirram o ódio na Bolívia e que ele e a população de Santa Cruz seguirão combatendo a ditadura de Evo Morales. O governador afirmou que seguirá combatendo o governo e, apesar de seu discurso ter se apegado aparentemente a princípios legalistas, democráticos e de intenções modernizadoras da política e da economia boliviana, não resta dúvida que a direita não deixará de usar nenhuma arma contra Evo, mesmo que isto signifique um enfrentamento muito mais violento ou mesmo um golpe militar. Evo tenta evitar ao máximo este cenário, em todos os seus discursos afirmava querer repactuar a Bolívia, defendendo a nacionalização dos recursos naturais, o fim da pobreza, o projeto de nova Constituição, mas também convocando os prefeitos ratificados à negociação. Afirmou assim, que seu governo está disposto a compatibilizar o projeto de nova Constituição com os Estatutos Autonômicos aprovados em algumas províncias. O projeto de nova constituição elaborado pelo MAS e defendido pelo governo Evo tem como carro chefe a legitimação e defesa da soberania de cerca de 36 etnias indígenas e essa proposta fora absolutamente rejeitada pela direita, mas também tem recebido muitas críticas de alguns setores da própria esquerda do país. Neste projeto, o governo torna contundente o seu caráter nacionalista campesino-indígena, de defesa da soberania nacional que passa pela soberania das dezenas de grupos étnicos que povoam a Bolívia. E para tanto, Evo Morales se apóia nas possibilidades de melhorias da economia boliviana com o aumento dos preços no mercado internacional de matérias-primas como o gás e o estanho. Assim, o governo teria condições materiais mais favoráveis que dariam mais margem para que se pudesse avançar com as propostas de nacionalização e também seguir com a linha da erradicação do analfabetismo na Bolívia, com projeto de democratização do Estado, combate à corrupção e finalmente a implementação da nova constituição. Dessa forma, para seguir governando sobre este projeto Evo também busca o apoio das forças armadas e algum tipo de conciliação com a burguesia deste país. Porém, a burguesia separatista do oriente (a “meia lua”) já deu provas que não está disposta a negociar e logo na primeira reunião com o governo após o referendo recusou a tríplice proposta de Evo de incluir as autonomias na nova Constituição, de fazer um pacto fiscal para decidir os recursos dos impostos petroleiros e de fazer um pacto constitucional para eleger a autoridades do Poder Judicial e Eleitoral. Esta tática de Evo de negociar com os golpistas neste momento só se justifica caso haja a intenção de se ganhar tempo e se fortalecer contra eles. Mesmo assim, durante todo o desenrolar do referendo e mesmo diante da vitória obtida por Evo nas urnas o discurso do governo ainda aponta para o pacto com este setor. Aí se encontra um problema grave. A direita, principalmente a do oriente, não irá negociar muito menos ceder de seu projeto de poder. E enquanto Evo assumir uma postura de conciliação e de dar legitimidade aos governadores da “meia lua”, ele estará desarmando a população contra os mesmos. É óbvio que as condições para este enfrentamento não são sempre favoráveis, de qualquer forma não resta alternativa senão fortalecer o movimento de massas e seguir debilitando a burguesia boliviana com as nacionalizações, com um programa para reforma agrária, com um projeto de previdência que favoreça os trabalhadores, etc. Pois é possível que não existindo uma mudança drástica neste sentido a direita passe a ocupar o espaço de Evo, principalmente a partir do momento que esta política de conciliação deixar de dar respostas. De qualquer forma, Evo conta ainda com grande apoio popular, principalmente do campo. A paralisação geral do dia 19 de agosto, denominada “paro cívico”, que fora convocada pelos governadores da “meia lua” contra as políticas de Evo, não teve adesão total da população desta região. A paralisação se restringiu basicamente às capitais dos departamentos e mesmo em Santa Cruz, onde o movimento foi mais forte, se teve notícia de resistência à paralisação em defesa de Evo. Assim, apesar de ter sido referendada, parece que a direita não conta com o apoio massivo da população nas suas ações mais radicalizadas. Neste sentido, o governo de Evo Morales tem a maioria do povo boliviano ao seu favor, que defende seu projeto de mudança social, o apóia na luta contra o neoliberalismo e o imperialismo norte-americano e com certeza será a principal força na batalha contra a burguesia golpista da Bolívia. Evo conta também com a simpatia de Hugo Chávez e pode se favorecer de uma conjuntura latino-americana na qual despontam novos e fortes processos de mobilização contra as imposições do capital, combinados com a subida ao poder de governos democráticos e populares, como é o caso recente do Paraguai com o presidente Fernando Lugo. Neste contexto, se as dificuldades são muitas, com certeza a luta do povo pode ser maior e trazer novas e grandes vitórias. Nathalie Drumon Coordenadora do DCE da USP |
UMA OUTRA HISTÓRIA A SER CONTADA | No mundo inteiro a juventude tem saído as ruas para demonstrar a sua indignação contra as injustiças do capitalismo e lutar por direitos sociais roubados ou nunca atendidos pela elite mundial! No Brasil muitos jovens também se organizam para lutar por uma outra sociedade! Nesta mesma marcha segue junto a juventude do PSOL! Somos socialistas e libertários, que lutamos por um amanhã sem desigualdades, opressões, exploração, lucro e juros, sem patrões!
terça-feira, 9 de setembro de 2008
PSOL esteve presente acompanhando o Referendo Revogatório na Bolívia
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