sábado, 25 de abril de 2009

Brasil-Venezuela: O nacional burguês versus o nacional popular


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A Venezuela oferece para o povo brasileiro uma excelente pedagogia do exemplo sobre a possibilidade de se planejar e consolidar um projeto baseado em um plano estratégico de desenvolvimento para uma classe específica: os trabalhadores populares.

O Presidente Chávez e sua equipe de governo tem claro para que grupo prioritário ditas mudanças foram desenhadas. E que táticas e estratégias deverão ser implementadas para que, na luta contra as oposições (nacionais e internacionais), se consiga avançar rumo à execução do projeto proposto.

Aparentemente, em meio à propagação discursiva do fim do socialismo real com a queda do muro de Berlim, a burguesia se projetava no imaginário coletivo nacional e internacional, como fomentadoras única e onipotente de planos de ação de curto, médio e longo prazos.

Mas, em essência, a política institucional em disputa nos processos de transição dos governos democráticos, deve ser manifesta como o espaço de debate, disputa e consolidação do projeto vitorioso, baseado em concretas medidas de realização do projeto com clara intencionalidade de classe.

Chávez e sua equipe consolidaram em 2007 o Plano socialista de desenvolvimento da Nação. Por meio deste plano tornaram explícitas as linhas centrais de sua estratégia socialista de médio e longo prazos.

Isso não quer dizer que não haja contradições, que as coisas estejam resolvidas e que, de inicio, o popular nacional já possa ser considerado revolucionário. Mas tampouco significa que a implementação de suas medidas nos últimos anos não tenha revolucionado as bases burguesas hegemonizadoras do poder no território venezuelano.

Sem dúvida alguma, frente à atual onda neoliberal vivida pelo continente, que tem países e governos como territórios férteis de sua ação, (como o caso brasileiro), tal postura é, além de um avanço, um suspiro possível sobre horizontes a serem alcançados a partir do trabalho concreto de retomada do público sobre o privado e do Estado como representante legítimo e legal de parte substantiva da sociedade.

Em seu plano socialista de desenvolvimento da nação baseado no tripé economia-moral-democracia socialistas, tal plano aprovado e referendado popularmente em 2007, evidencia como alguns povos latinos estão, na prática, explicitando o outro mundo necessariamente possível, a partir da ação planejada de governos pares no processo.

Frente a isso, e com base na realidade brasileira imersa no brutal processo de crise oriunda do histórico pacto burguês no governo, vejamos quais são os principais apontamentos venezuelanos que, em meio a crise, podem ser potencializados na histórica oportunidade de executar novos processos- projetos, populares.

Apontamentos:

1. A centralidade do Estado como interventor direto e indireto na economia. Como interventor direto, cabe ao Estado, retomar sua função de produtor direto nos principais setores estratégicos da economia (telecomunicações, energia, agricultura e petróleo), utilizando, sua gestão e ganhos em prol da sociedade, no que se consideram direitos sociais. Como interventor indireto, cabe ao Estado regular, fiscalizar, tributar progressivamente os setores econômicos em que atuam os capitais (trans)nacionais para que, em um viés nacional popular, quanto mais façam uso dos recursos que pertencem ao território e à sociedade, mais paguem tributos e operem em conformidade com as questões legais instituídas pela constituição nacional. Sem quebras de contratos, sem flexibilização do mundo do trabalho, sem jogadas contábeis que lhes favoreçam e aniquilem a possibilidade de utilização de parte expressiva dos recursos em projetos estruturais.

2. A centralidade do Estado como formulador de políticas públicas estratégicas. Evidenciar o histórico processo de subordinação popular ao projeto liderado pela classe dominante ao longo da história, e especificar, com transparência, o que se quer e como se logrará o que se quer com tal política. A formalização de um número expressivo de trabalhadores informais, o aumento de 20% do salário mínimo, o fomento da escolarização, a retomada de empresas públicas estatais, são alguns dos pontos centrais não assistenciais, estruturais, que dão vida ao plano bolivariano.

3. A centralidade do Estado comunicador em expressa manifestação de democratizar o acesso tanto às informações, quanto à formação consciente do que deve ser cobrado, exigido a partir daquilo que deve ser aniquilado e exposto sobre as históricas mazelas das relações desiguais manifestas em uma sociedade injusta baseada em uma brutal discrepância entre poucos ricos e muitos pobres.

4. A centralidade do Estado e sua clareza tática-estratégica nas relações bi e multilaterais com as demais nações. Aqui são termômetros importantes da forma e do conteúdo das negociações internacionais. Relações mais duras com os hegemônicos, relações mais solidárias com os latinos e relação mais próxima com os pares, são temas diferenciadores do processo de integração latina e retomada da relação cujo fim é a socialização dos fatores e meios de produção.

5. A centralidade do Estado na reformulação da educação e cultura nacionais como fomentadora de uma ética-moral, baseada em outros princípios que não o da concorrência, individualista, gananciosa, classificadora. O pacto do desenvolvimento nacional popular que vai migrando para o socialismo e tem como raízes sólidas mudanças estruturais contidas no marco constitucional, por isso legítimas (os referendos que o digam) e legais (a constituição os respalda).

Podemos não estar falando de imediato de uma ação e projeção socialistas. Mas o nacional popular venezuelano, protagonizado pelo perfil de seu governante e pela soberana vontade popular, nos mostra a diferença significativa entre projeto estrutural e projeto assistencialista.

Enquanto a equipe de governo venezuelana protagoniza a implementação de um projeto estrutural nacional popular, cujos rumos do desenvolvimento estão pautados na democratização e socialização da produção, o governo de cá, vê sua popularidade baixar ou subir com base em projetos assistenciais, nebulosos e cuja dimensão popular parece não romper o círculo vicioso do populismo.

A ruptura com o subimperialismo é possível. Entretanto, para que isso ocorra, é necessário planejar-executar uma política contra-hegemônica que, além de se contrapor à ordem dominante burguesa mundial, concretize um projeto de desenvolvimento e de poder diferenciados. Este pode ser o caso venezuelano. Mas nem em aparência se parece com o caso brasileiro.

09/04/09

Educadora popular, economista, integrante da Consulta Popular-ES

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