domingo, 15 de novembro de 2009

Os muros erguidos

RAFAEL MOYA


No dia 9 de novembro completaram-se 20 anos da queda do Muro de Berlim. Em 1989, assistíamos ao que parecia ser o início do fim da polarização mundial entre comunismo e capitalismo. Para os defensores do capitalismo, era o triunfo do livre mercado, o triunfo do individualismo sobre a “máquina opressora do comunismo”. Finalmente o mundo tinha um “vencedor”. Para os mais apressados, como Francis Fukuyama, era “o fim da história”. Diversos setores da esquerda também imaginavam que queda do muro seria uma vitória, era a vitória dos trabalhadores contra a burocracia estatal stalinista.

Passados 20 anos desse marco na história da humanidade, algumas certezas se abalaram. A história não acabou! O exemplo americano de vida tem se mostrado a cada dia mais inviável (pelo menos para o planeta Terra) e os desafios permanecem. Também não foi uma vitória dos trabalhadores contra a burocracia stalinista, pois o que vimos em praticamente todos os países do bloco comunista foi uma avassaladora abertura para o capitalismo. O muro de Berlim caiu, mas outros muros continuam a ser erguidos cotidianamente. Sejam eles de concreto ou de outros materiais.

Observamos estarrecidos o muro que Israel construiu para “controlar os terroristas da Palestina”. Os EUA constroem cercas na fronteira com o México para impedir que pessoas entrem em território americano — pessoas essas que fogem de um modelo econômico que não é o comunismo, mas, sim, um capitalismo defendido e implementado à risca pela cartilha econômica de Washington. Nas favelas do Rio de Janeiro, há projetos para a construção de muros para cercar as favelas. Como se não bastasse, continuamos a construir — em ritmo acelerado, apesar de insuficiente — os muros de presídios e penitenciárias.

Há também muros privados. Fenômeno relativamente recente, os condomínios fechados também são exemplos da construção de muros. As pessoas se refugiam dentro de seus muros, pois têm medo, e não me parece que temem o comunismo.

Além dos muros de concreto, ergueram-se os muros invisíveis. Erguemos os muros da indiferença, da exclusão social, da desigualdade social, da ignorância e do preconceito. Somos capazes de transpormos o muro do espaço e pisarmos na Lua, mas não somos capazes de pular a mureta da fome. Somos capazes de saltarmos a muralha da distância e criarmos a cada dia meios de comunicação mais velozes e eficientes, mas não somos capazes de saltarmos a mureta da intolerância e da indiferença com o próximo. Seremos capazes de transpormos o muro das dificuldades e traremos para nosso País uma Copa do Mundo e uma Olimpíada, mas temo não conseguirmos passar pela mureta da falta de saúde e educação para nosso povo. Fomos capazes de superar o muro econômico e construímos uma Campinas muito pujante economicamente, mas não conseguimos superar a mureta dos desamparados que perambulam pelas ruas de nossa cidade.

O muro de Berlim tinha cerca de 155 quilômetros, os muros invisíveis têm extensão e altura imensamente maiores. Após 20 anos de sua queda, é necessário refletirmos sobre os desafios que permanecem. Devemos olhar para o futuro e pensarmos no que iremos construir. Os modelos do passado não nos servem mais. Devemos aprender com os erros da União Soviética. Mas o capitalismo continuará a nos levar à extinção. De maneira muito mais eficaz, esse sistema constrói, além de muros de concreto, muros invisíveis muito mais difíceis de serem transpostos. O desafio está colocado. Empunhemos nossas marretas, mas também nossas flores, há muitos muros a serem derrubados.

Rafael Moya é advogado, membro do Fórum de Direitos Humanos de Campinas (www.rafaelmoya.blogspot.com)

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