segunda-feira, 15 de outubro de 2007

O que quer Heloísa Helena?

Por Gilberto Maringoni
membro do Diretório Nacional do PSOL

Presidente do partido ataca publicamente resolução do I Congresso sobre descriminalização do aborto. É uma prática autoritária e antidemocrática, que precisa acabar.

O PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL) ESTÁ SOB ATAQUE. A agressão não vem da direita, do governo ou da imprensa. Ela parte de quem, em tese, deveria ser a principal defensora das decisões da agremiação, sua presidente Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho. Derrotada democraticamente no debate sobre o direito ao aborto, no Congresso do partido, ela está, publicamente, investindo contra e desqualificando a posição coletiva. Se formos ao pé da letra, a ex-senadora está abrindo uma dissidência.

Vamos explicar o caso. Entre os dias 7 e 10 de junho último, o PSOL realizou seu I Congresso Nacional, no Rio de Janeiro. Foi o mais importante esforço coletivo que o partido realizou até hoje. Uma das principais resoluções, debatida e aprovada por ampla maioria, diz o seguinte:
“O PSOL defende a descriminalização e legalização do aborto, conjugadas a uma política de saúde sexual e reprodutiva nos marcos do SUS (Sistema Único de Saúde), universal, pública, de qualidade”.

Como afirma uma nota aprovada pelo Diretório Regional de São Paulo, dois meses depois,

“Além de esta resolução representar um grande avanço para o partido e de sintonizá-lo com uma bandeira histórica das lutas das mulheres brasileiras, ela integra um conjunto de deliberações que visam construir uma alternativa à esquerda em nosso país, baseada numa cultura política solidária, fraterna, democrática e coletiva”.

Pois bem. Qual não foi a surpresa da militância ao saber, pela imprensa, que a presidente do partido foi uma das principais oradoras no lançamento de um certo “Movimento Brasil sem Aborto", no último dia 1º de agosto e de uma “Marcha Nacional da Cidadania em Defesa da Vida”, sobre o mesmo tema, quinze dias depois, em Brasília. Presentes, estavam alguns dos setores mais conservadores de diversas igrejas. Entre várias declarações, a ex-senadora afirmou que “A legalização do aborto não é uma proposta moderna. É conservadora e reacionária”.
www.cnbb.org.br/index.php?op=noticia&subop=16111 .

Ninguém pode exigir que a ex-senadora Heloísa Helena contrarie suas legítimas convicções individuais e se engaje numa campanha pela descriminalização do aborto. Ao mesmo tempo, por suas responsabilidades no PSOL, ela não pode militar publicamente contra uma deliberação da maior instância partidária. Questiona-se aqui a possibilidade de um dirigente atacar externamente uma resolução interna".

Quatro diretórios estaduais – São Paulo, Rio de Janeiro, Distrito Federal e Ceará – aprovaram notas protestando contra a atuação da presidente do PSOL e solicitando explicações à Executiva Nacional. Embora a ex-senadora tenha ventilado suas opiniões abertamente, os quatro diretórios decidiram não fazer um debate público.

EXECUTIVA IGNOROU ASSUNTO

Após o Congresso, a Executiva Nacional reuniu-se uma única vez e não tratou do assunto. Mesmo assim, após Heloísa Helena ter recebido as mensagens dos Estados, vários militantes acharam que ela, sensível ao apelo, acataria a resolução congressual.
Não é o que vem acontecendo. No último dia 10 de outubro, a ex-senadora participou de uma audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados. Segundo o portal da instituição, a pauta era a “Descriminalização do aborto provocado pela própria gestante ou com o seu consentimento (Projeto de Lei 1135/91). Atualmente, a legislação prevê detenção de um a três anos para esses casos”. Na sessão, a dirigente ampliou sua militância antipartidária e antifeminista. Segundo o noticiário da Câmara,

“A ex-senadora Heloísa Helena afirmou que o aborto não pode ser classificado como um dos principais temas de saúde pública, pois considera que a quantidade de mortes provocada pela prática é muito pequena”.

Mais adiante, ela declarou que elevar o assunto ao topo dos problemas de saúde pública é uma "farsa técnica e uma fraude política".
www2.camara.gov.br/internet/homeagencia/materias.html?pk=111708&searchterm=heloisa

É lamentável que uma dirigente socialista externe posições tão obscurantistas e atrasadas, aliando-se nessa empreitada a setores sociais reacionários. Com tal gesto, Heloísa Helena coloca-se à direita do Ministério da Saúde e da Ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que emitiram opiniões favoráveis ao direito à interrupção da gravidez.

O pior é que ao fazer isso, a ex-candidata a presidência da República desmoraliza o que centenas de delegados de todo o Brasil aprovaram, após uma extenuante jornada de debates. O gesto da presidente do PSOL é individualista, autoritário e desmoraliza esforços para a construção de uma nova cultura política de esquerda.

TRADIÇÃO PATRIMONIALISTA

Infelizmente, é larga a tradição brasileira de chefes partidários colocarem-se acima dos coletivos. Isso vem do período imperial, no qual oligarcas regionais dominavam arremedos de agremiações e faziam o que bem entendiam. No século XX, incontáveis caciques políticos abusaram dessa prática. Suas raízes estão no patrimonialismo das classes dominantes, pródigas em enxergarem a coisa pública como extensão de seus domínios. O PSOL não precisa de chefes. Precisa de dirigentes democráticos e socialistas, que rompam com os vícios da política tradicional.

Este tema deve ser um dos principais da pauta do Diretório Nacional do partido, ainda não reunido, quatro meses após o Congresso. Lá, deve-se oferecer à presidente do PSOL duas opções:

1. Não atacar mais publicamente decisões partidárias ou;

2. Licenciar-se de suas funções dirigentes enquanto desejar fazer sua pregação pública contra o partido.

Deve-se debater livremente e depois votar. É o mais democrático.

Uma observação final. Foi dito linhas atrás que esta é uma questão interna. Este artigo só está sendo publicado fora das instâncias partidárias pelo fato de a ex-senadora ter decidido fazer uma disputa pública em matéria na qual foi derrotada internamente. Por larga margem.

3 comentários:

Anônimo disse...

Olha, o assunto aborto é contraditório e deve ser muito bem discutido. Minha opinião particular é que acima de tudo o direito a vida seja mantido, qualquer forma de aborto é uma restrição a vida. Portanto legalizar o aborto não será a solução dos problemas.

Anônimo disse...

Heloísa Helena é uma heroína,por isso eu votei nela e sempre vou votar,o meu principal critério nas proximas eleições será votar naqueles que defenderem a vida e os direitos dos pequeninos.
"O aborto não é, como dizem, simplesmente um assassinato. É um roubo... Nem pode haver roubo maior. Porque, ao malogrado nascituro, rouba-se-lhe este mundo, o céu, as estrelas, o universo, tudo. O aborto é o roubo infinito"(Mário Quintana)

Igor Pereira disse...

Estou com Heloisa Helena! Parabéns a ela pelo seu posicionamento corajoso, livre e pós-moderno! O respeito por todas as formas de vida é uma das bandeiras do novo milênio! Obrigado, Heloisa.