“Aquilo não é vida. Quero esquecer da colheita da cana.”
José Farias dos Santos, trabalhador rural.
José Farias dos Santos, trabalhador rural.
Cerca de 300 integrantes do MST, sindicatos, Abeef (Associação Brasileira de Estudantes de Engenharia Florestal) e estudantes da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz/USP) estão acampados desde a manhã de hoje (30/4) em frente à Usina Santa Helena, pertencente ao Grupo Cosan, no município de Rio das Pedras, região de Piracicaba (160 km da capital). Os portões estão bloqueados para impedir a entrada de caminhões e parar o processo de produção. As saídas estão liberadas.
Às vésperas do dia do trabalho – 1° de maio – o objetivo da ação é denunciar as condições dos trabalhadores no corte de cana e a lentidão e morosidade do Executivo, Legislativo e Judiciário em combater este tipo de prática e em punir os responsáveis.
Hoje os trabalhadores do corte da cana enfrentam uma realidade aterrorizante, que não condiz em nada com o discurso promovido pelo agronegócio. A busca por maior produtividade impõe uma excessiva jornada de trabalho, na qual precisam cumprir uma cota diária que chega até a 15 toneladas. Além disso, provoca seqüelas físicas como dores na coluna e nos pés, deformações, tendinites, entre outras. Em alguns casos leva até mesmo a morte por exaustão. Somente no estado de São Paulo foram constatadas mais de 20 mortes desde 2004. Estudos comprovam que esses trabalhadores possuem uma vida útil de trabalho de 10 a 12 anos, inferior a dos escravos do século XIX.
Essas condições são o que definem o trabalho precarizado como a escravidão dos nossos dias. O Grupo Cosan, a Usina Santa Helena e a Empreiteira Rural Menudo respondem na Justiça a um processo movido por mais de 40 trabalhadores rurais que denunciam: escravidão por dívida; cárcere privado; terceirização fraudulenta; assédio moral e ameaças com armas de fogo; condições precárias de alojamento; super-exploração do trabalho; aliciamento de trabalhadores das regiões mais pobres do país; ausência total de assistência médica.
Além desse processo, o Grupo Cosan é citado em outras 103 denúncias na área trabalhista. É com essa forma de exploração desumana dos trabalhadores que o agronegócio consegue seus lucros. Com esse mesmo dinheiro sujo o Grupo Cosan comprou a Esso do Brasil por 826 milhões de dólares. Agora, o Grupo Cosan controla mais de 1500 postos de combustíveis em todo o país, onde colocará seu etanol feito às custas do sofrimento e morte de milhares de trabalhadores em seus canaviais.
A ação também tem o intuito de se somar a diversos movimentos sociais e de defesa dos direitos humanos para exigir a aprovação da PEC (Projeto de Emenda Constitucional) número 438 de 2001. A PEC 438/01, conhecida com PEC do Trabalho Escravo, prevê o confisco para fins de Reforma Agrária de qualquer fazenda em que seja constatado o uso de trabalho precarizado em condições análogas à de escravidão. O que condiz com a Constituição Brasileira de 1988 - artigo 186- em que toda propriedade deve cumprir sua Função Social (produtividade, respeito ao meio ambiente e às leis trabalhistas), caso contrário será destinada para Reforma Agrária.
Os manifestantes defendem que a terra seja utilizada para produzir vida e não mortes. Enquanto poucas empresas enriquecem às custas do trabalho precarizado, milhões de pessoas morrem de fome no mundo. A escassez de alimentos vivida atualmente é conseqüência da prioridade de utilização da terra para o monocultivo da cana-de-açúcar e produção de etanol. Em recentes declarações, o relator especial da ONU para o Direito à Alimentação, o suíço Jean Ziegler, afirmou que a produção em massa de agrocombustíveis “representa um crime contra a humanidade, em decorrência de seu impacto nos preços mundiais de alimentos”.
Assim, somente a mudança da atual política agrícola – que prioriza o agronegócio – transformará essa realidade.
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