Discurso do Dep. Ivan Valente
"Sr. Presidente, senhoras e senhores deputados,
Doze anos atrás, o Brasil vivia um dos acontecimentos mais vergonhosos de sua história. Numa ação de extrema violência da polícia militar do Pará, 19 trabalhadores rurais foram assassinados, 69 mutilados e dezenas ficaram feridos durante o Massacre de Eldorado de Carajás. Até hoje, os 155 policiais participantes da operação estão soltos. Entre os 144 incriminados, apenas dois foram condenados depois de três conturbados julgamentos: o coronel Mário Collares Pantoja e o major José Maria Pereira de Oliveira, que aguardam em liberdade a análise do recurso da sentença pela ministra Laurita Vaz, do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Em função do benefício aos dois únicos condenados, as duas principais testemunhas de acusação se sentiram intimidadas a não comparecer mais ao julgamento, após receberem diversas ameaças de morte.
Por outro lado, os responsáveis políticos, que tiveram participação decisiva no massacre, sequer foram envolvidos no processo. Entre eles, o governador do Pará à época, Almir Gabriel, o comandante geral da Polícia Militar e o secretário de Segurança Pública, Paulo Sette Câmara. Ou seja, nossa Justiça se recusa a colocar o Estado no banco dos réus.
Na verdade, sr. Presidente, a justiça está longe de ser feita neste caso. Até hoje, as pessoas mutiladas no episódio e as 13 viúvas que tiveram seus maridos executados naquele dia não receberam suas indenizações. São 12 anos de impunidade. É por isso que os sobreviventes do massacre e trabalhadores rurais sem-terra acampam, desde a segunda-feira passada, em frente ao Palácio dos Despachos no Pará, sede do governo do estado. Eles cobram da governadora Ana Júlia Carepa o cumprimento de diversas promessas, como o atendimento médico aos feridos no massacre, que ficaram com balas alojadas pelo corpo.
Em memória a Eldorado dos Carajás, e em luta permanente pela reforma agrária, a Jornada Nacional de Lutas do MST já mobilizou, desde o final de semana, famílias acampadas e assentadas em 15 estados brasileiros e aqui no Distrito Federal. Os trabalhadores e trabalhadoras sem-terra exigem o assentamento de 150 mil famílias acampadas e cobram investimentos públicos nesses assentamentos. O Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), por exemplo, não considera as especificidades das áreas de Reforma Agrária. Os assentados não conseguem acessar nem 15% dos contratos disponibilizados pelo MDA. Além disso, no ano passado, o governo federal havia prometido liberar crédito para a construção de 31 mil habitações, sendo que a demanda no campo é de 100 mil. Foram contratadas apenas 2 mil. Enquanto isso, segue a violência no campo, patrocinada pelos grandes produtores de monoculturas voltadas à exportação.
As famílias sem-terra exigem também mudanças na política econômica para criar condições para a sustentabilidade de um modelo agrícola baseado em pequenas e médias propriedades. Esta, na verdade, é a razão do grande atraso e lentidão na reforma agrária em nosso país, senhores deputados. O governo hoje prioriza o agronegócio e atua em benefício das grandes empresas e do capital financeiro, perpetuando o latifúndio e inviabilizando o processo de democratização da terra.
Que neste 17 de abril, Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária e Dia Internacional de Luta Camponesa, lembremo-nos dos mártires de Eldorado dos Carajás. Sua luta deve nos inspirar e ser a luta de todos os brasileiros e brasileiras.
Obrigado."
Deputado federal Ivan Valente
PSOL/SP
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